Outras preces.
Agora que Marcelo Rebelo de Sousa atingiu a aprovação quase unânime com a declaração de Oliveira do Hospital em que entalou o governo, irritou a esquerdalhada (que rosna em silêncio a sua raiva contida pela popularidade do PR) e deixou excitada a não esquerda à beira de uma ejaculação precoce, torna-se ainda mais importante tentar um retrato de MRS sem as espessas camadas de maquilhagem mediática.
É por isso de leitura obrigatória o que disse em entrevista ao Expresso de ontem Carlos Blanco de Morais, seu aluno e assistente e de quem MRS foi orientador da tese de doutoramento. Lá se encontram os traços que por aqui temos apontado como perigosos num PR: a volubilidade, o catavento mediático, o populismo ("inclusivo") e a obsessão pela popularidade, o manobrismo, o calculismo e a frieza por trás da fachada dos afectos. Aqui vão alguns excertos. Não digam que não foram avisados.
«Depois do que aconteceu é difícil que continue a sua função de escudo ou para-raios. O que não quer dizer, até tendo em vista a idiossincrasia e psicologia do PR, que é muito fluida e por vezes volúvel, que tenha rompido com a atual coligação. Tenho as maiores dúvidas. (…)
Que eu designei como semipopulismo porque o PR capta e diz aquilo que a população quer ouvir e isso faz parte das características do populismo. A sua conduta e gestos de natureza simbólica marcam esse entrosamento entre o chefe de Estado e a população comum. Só não será populismo porque os populistas operam habitualmente através de uma dicotomia amigo-inimigo, fixam a existência de um adversário. O PR não, tem um discurso inclusivo. A ideia não é estabelecer um inimigo, mas resolver problemas e captar todas as dificuldades, anseios e vender alguns sonhos. (…)
É um populismo de escalão mais entrosado com a população comum, o que implica uma mistura entre sensibilidade pessoal e teatro, que gere admiravelmente. (…)
O PR até agora usou muito pouco os seus poderes jurídico-constitucionais, teve uma função tribunícia, fez advertências, usou da palavra e da sua proximidade. Aí, inflou a sua popularidade. A estratégia presidencial desta 'cooperação de veludo' foi entrosar-se com o Governo apanhando o embalo do estado de graça deste, inflando a sua popularidade e em função dela pretende usá-la politicamente, convertendo esse acumulador de popularidade numa manifestação de autoridade. (…)
A ideia de que o Presidente fez agora uma ameaça de dissolver o Parlamento é um mero desejo. O PR é muito flexível, respira política 24h por dia e é cauteloso. Só dissolveria com a certeza clara de que o partido do poder não retornaria mais forte ou em coligação. (…)
Se há alguém que faz cálculos políticos e não atua emotivamente é o PR. A gestão de afetos faz parte da sua estratégia presidencial, mas a idiossincrasia do Presidente é fria e de jogador. (…)
O comentador não morreu na figura do PR, foi apenas reconvertido numa função tribunícia. (…)
Mesmo para os 'marcelólogos', o PR é sempre imprevisível. Ninguém pode estar seguro em momento nenhum de qual vai ser a sua conduta. A única coisa de que se pode ter a certeza é de que nunca afrontará de forma ostensiva o vento da opinião pública.»
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