Não vou gastar mais cera com tão ruim defunto. Depois de 110 mortos e três relatórios independentes, o colapso do governo em geral e da Protecção Civil em particular é demasiado óbvio, salvo para os 52% dos portugueses que vivem prisioneiros nas suas bolhas.
Pelas mesmas razões não vou esmiuçar a comédia do material de Tancos, que no limite poderia não ter sido furtado e que apareceu na Chamusca por indicação de um denunciante anónimo que o primeiro-ministro se esqueceu de felicitar. Talvez valha a pena acrescentar que a comédia de Tancos, em cena há vários meses, foi precedida de uma outra, só agora chegada ao palco: a GNR recuperou umas miudezas (cinco toneladas de peças de um carro de combate) furtadas do Campo Militar de Santa Margarida, que também apareceram ainda antes do caso de Tancos numa sucata na Chamusca. A Chamusca vê-se assim promovida a uma espécie de armazém de reserva das forças desarmadas portuguesas.
Também é quase supérfluo repisar o fim (até ver) da «paz social» e o renascer das «grandes lutas do povo trabalhador» pela mão dos sindicatos controlados pelos comunistas em que a pequena-burguesia dos funcionários públicos é o novo proletariado e lá vão fazer mais uma greve-tipo-ponte na próxima sexta-feira. Preparemo-nos, pois, para mais rondas de concessão de mordomias à clientela eleitoral da geringonça. A título de exemplo temos a sucumbência aos enfermeiros, depois de vários meses a partir pedra, ou as 35 horas para todos no SNS a partir do segundo semestre de 2018.
E, por falar em concessões à clientela, o economista João Duque chama a atenção para as possíveis consequências dessas concessões por via da combinação do efeito dotação (endowment effect) e da aversão à perda que leva as pessoas a valorizar mais o que perdem do que o que ganham - sobretudo o que recuperam - anulando rapidamente os efeitos das «restituições» e obrigando o governo a esmifrar ainda mais os «ricos» (sinónimo para a geringonça dos 10% de contribuintes que pagam 70% dos impostos) para manter satisfeita a sua clientela.
Tratemos agora da remodelação do governo induzida pelo Presidente dos Afectos que, entalado pela inoperância criminosa do governo, viu-se obrigado a suspender o bromance com Costa para não ser contagiado com os 110 mortos. Se houvesse dúvidas sobre a fragilidade deste governo, dependente dos favores de comunistas e berloquistas e das conveniência de MRS, teriam ficado esclarecidas com a demissão à pressa de uma ministra, que num dia era indispensável e no outro era uma demissão inevitável, e a jura de adopção de um conjunto de medidas inspiradas pelo relatório da comissão de inquérito aos incêndios de Pedrógão, adopção que mostra muito mais conveniência do que convicção - como lembra o Expresso, «O plano que Costa meteu na gaveta em 2005 está de volta».
Além da fragilidade do governo, esta remodelação também mostra uma das características que faz de Costa um um manobrador hábil mas um político medíocre, arrogante e sem guts: rodear-se de amigos nas horas de aperto. Foi assim que substituiu uma ministra irremediavelmente incompetente (mantida até ao limite para lhe servir de pára-choques) por um amigo do peito e no lugar deste colocou outro amigo do peito Pedro Siza Vieira, um que também achava que os portugueses estavam «a viver abaixo das suas possibilidades». E não, ele não queria dizer que os portugueses poderiam fazer, estudar, aplicar-se mais; ele queria dizer que portugueses poderiam continuar a fazer a mesma coisa e a «viver» melhor. A criatura é considerada muito talentosa e imune a conflitos de interesse, como se confirma sabendo-se que andou envolvido no caso SIRESP e nas medidas para o crédito malparado na banca e para a supervisão financeira.
Voltando aos expedientes orçamentais, o próprio relatório do OE 2018 mostra como as cativações foram selectivas recaindo em grande escala (mais de mil milhões de euros) na Defesa Nacional, Segurança Social, Mar, Economia e Ciência e, pelo contrário, se gastou mais nos ministérios onde impera a clientela e se fazem sentir as pressões de comunistas e bloquistas (Educação, Saúde e Finanças).
Exemplo dessas cativações que ameaçam paralisar a máquina administrativo do Estado é o sistema de controlo e gestão do tráfego aéreo que já teve quatro falhas este ano e precisa urgentemente de ser substituído. Ou a degradação do SNS que o governo tentou escamotear falseando os dados sobre filas de espera de consultar e cirurgias segundo apurou o Tribunal de Contas. Sublinhe-se a fraude estatística e contabilística recorrente que os governos socialistas praticam sistematicamente e que teve o seu apogeu com os dois governos de José Sócrates e registe-se que o governo de Costa voltará a ultrapassar em 2018 o segundo governo de Sócrates em gastos dos gabinetes governamentais. Veja-se o diagrama seguinte:
Fonte: Dinheiro Vivo |
Esta semana ainda não vou tratar do tema OE 2018 que ainda vai dar muitas voltas empurrado pelo PR (medidas relacionadas com as florestas) e os parceiros da geringonça (distribuição de bonificações à clientela).
Termino citando Miranda Sarmento no ECO salientando a fragilidade da economia portuguesa «presa por quatro “grandes arames”: primeiro, a política monetária expansionista do BCE; segundo, um crescimento moderado das economias Europeias; terceiro, o baixo preço do petróleo; quarto, um efeito de crescimento do turismo (embora outros setores estejam também a crescer, o turismo sustenta parte considerável do crescimento)». Desses quatro arames o primeiro e o terceiro têm os dias contados, o segundo prevê-se que virá a ser ainda mais moderado. Ficamos com o quarto que tem alguma volatilidade (tendências, terrorismo) e está sob permanente ameaça da esquerdalhada e do politicamente correcto.
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