«É muito comum ouvir-se dizer que nos anos da troika a redução do défice orçamental foi conseguida em dois terços à custa de aumentos de impostos e apenas em um terço com redução de despesa. Isto quando se sabe que o programa de ajustamento previa o contrário: uma redução do défice que fosse o resultado em três quartos de redução da despesa e em um quarto de aumento da receita.
Hoje, quando se discute o assunto, estas fracções são um dado adquirido. Por exemplo, há umas semanas, no relatório de auto-avaliação do FMI, Eichenbaum, Rebelo e Resende dão como certo que, na prática, dois terços do esforço orçamental foram feitos à conta da subida de impostos e que apenas um terço resultou de uma redução da despesa. Perante isto, membros e apoiantes do anterior governo sentem necessidade de se justificar e, tipicamente, desculpam-se com as decisões do Tribunal Constitucional.
Na verdade, este facto está tão enraizado nas nossas cabeças que tanto eu como os meus co-autores do livro Crise e Castigo ficámos admirados quando vimos os números da despesa e da receita pública. Entre 2010 e 2014, a despesa pública primária (ou seja, sem contar com os juros) caiu um pouco mais de 8 mil milhões de euros. A receita aumentou ligeiramente acima de 4 mil milhões. Fazendo as contas, a conclusão é imediata: o ajustamento orçamental feito nos anos da troika foi de dois terços do lado da despesa e apenas um terço por via da receita.
(...)
Portanto, na minha opinião, do ponto de vista orçamental, entre 2010 e 2014, dois terços do ajustamento foram feitos do lado da despesa e não da receita. Todos sabemos que uma mentira repetida muitas vezes se torna a verdade oficial, mas, ainda assim, tenho dificuldades em perceber por que motivo os apoiantes do PSD/CDS entregam de mão-beijada este pseudo-facto.»
«Não rezem o terço!», Luís Aguiar-Conraria no Observador
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