«Em Portugal, o Estado teve sempre um grande papel económico. Não falando das origens, em que a economia dependia da guerra, houve a empresa da índia, em grande parte monopólio da Coroa, a empresa do Brasil, também com os seus monopólios estatais, e os empréstimos externos garantidos pelo Estado, por meio dos quais se realizaram as obras públicas. A história económica portuguesa seria, em grande parte, a história de um capitalismo de Estado, se não lhe faltasse o espírito competitivo, próprio da empresa capitalista.
Ao Estado competia principalmente a distribuição da riqueza, distribuição que se fazia segundo critérios de clientelas do Poder. O dinheiro não era distribuído em função da actividade produtiva, mas sim em função do aprazimento da Corte, da influência política de certas famílias, etc.
Por outro lado, os bens da Igreja, descontando a época inicial das Ordens arroteadoras de terras, como Cister, eram também usufruídas por não produtores e sustentavam uma numerosa parasitagem.
Donde resulta que a iniciativa privada teve sempre em Portugal um papel restrito e apagado. O que entre nós houve sempre foi uma intervenção primacial do Estado e, em consequência disso, uma tendência para a pedinchice, para as clientelas, para a disputa do poder político, corno meio de alcançar benefícios económicos. Quando, após o 28 de Setembro, e principalmente o 12 de Março de 75, o Estado se apoderou dos bancos e de numerosas empresas, não se criou uma situação nova em Portugal, antes se intensificou alguma coisa que estava nos hábitos ancestrais dos Portugueses: a posse de um largo sector da economia pelo Estado e a distribuição dos dividendos não segundo a capacidade dos empresários, mas segundo a pressão das clientelas do Poder. E tal como o monopólio de Estado no Antigo Regime, prolongado no liberalismo, tinha dado origem a uma numerosa parasitagem, assim aconteceu no Portugal dito socialista. O Estado foi solicitado por uma multidão de candidatos ao «empregozinho», que deram entrada graças à cunha política, e camadas sucessivas de gente in activa, conforme as conjunturas políticas, foram tomando lugar à mesa do orçamento. Um velho vício nacional agravado, porque mult1pl1cado por quatro partidos, isto é, quatro dispensadores de emprego.
«A alternativa», capítulo de «Filhos de Saturno», de António José Saraiva (publicado originalmente no Diário de Notícias de 29-12-1978)
(Continua)
Boa ideia a de, a pouco e pouco, ir ensinando António José Saraiva.
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