Já aqui escrevi que se fala muito da dívida pública, que é de facto pesada, e fala-se muito pouco da dívida privada, que é de facto muito mais pesada, quer em termos relativos à dívida pública, quer em termos internacionais. Veja-se o diagrama seguinte e tenha-se em conta que a dívida dos bancos não está incluída.
Como escreve o Wall Street Journal, primeiro tivemos a festa, depois a bebedeira e por fim a ressaca. Para sair da ressaca, citam as mezinhas de Carmen Reinhart & Kenneth Rogoff que são: reestruturação da dívida, inflação e «repressão financeira», ou seja o governo forçar os bancos a disponibilizarem crédito barato à economia. Por vezes tenho dificuldade em perceber como é que luminárias deste calibre, aliás várias vezes citadas no (Im)pertinências, produzem tais vacuidades.
É claro que a reestruturação da dívida poderia aliviar o problema, dependendo da modalidade (perdão parcial ou total da dívida, redução ou anulação dos juros e reescalonamento das maturidades ou uma combinação destas modalidade) e da extensão que revestisse. Recorde-se que ainda recentemente «reestruturámos» a dívida quando conseguimos da troika um reescalonamento das maturidades dos vários empréstimos que constituem os cerca de 80 mil milhões que nos emprestaram. Contudo, se falarmos num haircut, é bom não esquecer que a banca portuguesa tem cerca de 30% da dívida pública portuguesa e 1/3 do haircut seria um tiro no próprio pé.
Inflação? A Carmen e o Kenneth devem estar a brincar connosco. Onde é que os PIGS detêm uma moeda própria que pudessem desvalorizar? Desvalorizar o euro? Só por cima do cadáver da tia Angela. Anyway, seria isso uma solução para uma moeda partilhada por países tão parecidos como Grécia e Finlândia, Portugal e Áustria ou Irlanda e Polónia?
Resta-nos a «repressão financeira». Obrigar os bancos a conceder crédito barato é o que os governos têm feito impingindo-lhe doses maciças de dívida pública, que eles compram com grande entusiamo, ou empurrando as empresas públicas para o colo desses mesmos bancos.
Então qual é a terapêutica? Talvez uma combinação em doses moderadas dessas três mesinhas e uma dose reforçada de reformas do Estado aliviando-o da pança pantagruélica e tirando-o de cima da economia. Em qualquer caso, para uma doença que foi incubada durante décadas, não há poções milagrosas e, mesmo adoptando as políticas certas e fazendo as reformas indispensáveis, o que está longe de acontecer, precisamos de uma ou duas décadas sem entrar em desvarios.
Se a principal componente da divida é privada, porque é que reduzir o peso do estado é assim tão importante?
ResponderEliminarNelson Goncalves
Porque o Estado consome recursos e metade do produto da economia de uma forma ineficiente e pouco valor acrescenta. O problema da dívida pública e privada, além da sua dimensão insustentável, é ter sido usada não para investimento produtivo mas, por exemplo, para torrar em infraestruturas inúteis e em 1,7 milhões de casinhas nos últimos 10 anos, das quais 735 mil não estão habitadas, correspondentes a 38 mil milhões de euros improdutivos.
ResponderEliminarÀs casinhas e infraestruturas podemos acrescentar alguns milhões de veículos de um dos parques automóveis de maior dimensão relativa na Europa.
Estes «investimentos» em grande parte financiados por dívida externa não geram retorno para pagar a dívida.
Eu estou de acordo com a parte do estado ser ineficiente.
ResponderEliminarA minha pergunta era mais ao lado.
O peso do Estado português na economia já elevado pelo menos desde os anos do Guterres. Ora se nestes 15-20 anos, a dívida privada aumentou enormemente e o peso do estado era já grande qb então porque é que reduzir o peso do estado vai ajudar a reduzir a dívida privada ?
Se se reduzir o peso do Estado, eu estaria à espera que a dívida privada aumentasse pois há mais dinheiro privado para torrar.
Também não percebo porque é que a dívida pública e privada são postas no mesmo saco. Se a dívida privada fizer um default aos bancos estrangeiros, quem se lixa são so estrangeiros. Pelo menos no imediato, porque a médio e longo prazo seria mais difícil para os privados pedir dinheiro emprestado lá fora.
Note-se que não sou economista, e portanto estou a falar de algo que compreendo mal.
Nelson Gonçalves