19/10/2012

DIÁRIO DE BORDO: Olha se a moda existisse na década de 60…

Entre o princípio da década de 60 e o princípio da década de 70 emigraram legal e ilegalmente, a salto como então se dizia, correndo o risco de levar um tiro, mais de um milhão de portugueses. Muitos desses portugueses eram analfabetos e, portanto, não poderiam escrever pelo seu punho cartas ao almirante Américo Tomás, o antecessor do professor Cavaco Silva nesse período (1958-1974). Na melhor hipótese, ditariam uma carta ao presidente quando chegassem ao seu destino: exmo senhor prezidente, nós por cá estemos todos bem.


Caixa de correio do almirante Tomás com
cartas de emigrantes que trabalhavam
no bâtiment e viviam na bidonville
Se esses emigrantes soubessem escrever e estivessem para aí voltados, algo extremamente improvável porque não lhes passaria pelo cabeça produzir literatura epistolar de despedida, e fizessem como o enfermeiro Pedro Marques que cinquenta anos mais tarde escreveu uma «Carta de despedida à Presidência da República» muito festejada nos mídia, a caixa de correio de Belém teria sido abarrotada com quase 400 cartas por dia e o almirante Tomás teria desistido das inaugurações e seria obrigado a horas extraordinárias não remuneradas para as ler.

Queixa-se o rapaz de se sentir «expulso» do país, informa que vai trabalhar para Londres e  «implora» que não seja criado um «imposto sobre as lágrimas e muito menos sobre a saudade». Sorte a dele que não vai a salto arriscando-se a levar uma bala no canastro. Na pior hipótese voa na easyjet pelo preço de um bilhete para o Rock in Rio e tem à sua espera um emprego num hospital público de Northampton e não um trabalho de pedreiro a dias no bâtiment e um alojamento numa bidonville.

DECLARAÇÃO DE INTERESSE:
Sei que num país de queixinhas, infestado pela songamonguice, onde muitos dos nossos jovens fazem cursos para serem felizes em universidades a 10 minutos da casa da mãezinha, este post pode ser considerado uma ofensa à auto-estima autóctone. Invoco em minha defesa ter uma família e parentela de emigrantes e um filho em Londres, onde estudou trabalhando e onde trabalha estudando, e declaro solenemente que se o rapaz escrevesse uma carta daquelas fosse a quem fosse tê-lo-ia deserdado - na hipótese remota de, quando bater a bota, sobrar algo do meu «fundo de compensação» do esbulho das pensões que o Estado Sucial está a levar a cabo.

3 comentários:

  1. Pode ver-se como esta cultura protetora de esquerda tornou as pessoas em vítimas.

    tina

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  2. "Queixa-se o rapaz de se sentir «expulso» do país, informa que vai trabalhar para Londres e «implora» que não seja criado um «imposto sobre as lágrimas e muito menos sobre a saudade». Sorte a dele que não vai a salto arriscando-se a levar uma bala no canastro. Na pior hipótese voa na easyjet pelo preço de um bilhete para o Rock in Rio e tem à sua espera um emprego num hospital público de Northampton e não um trabalho de pedreiro a dias no bâtiment e um alojamento numa bidonville." De facto, a memória é uma coisa muito curta.

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