17/08/2011

SERVIÇO PÚBLICO: Déjà vu

Se há actividade em que os portugueses deveriam ser bem sucedidos é a mineração. Pelo menos a abrir buracos no orçamento, só na Grécia temos concorrência à altura. Com a ajuda de fita métrica do trio FMI/BCE/FEEF lá se conseguiu medir mais um buraco de 1,8 mil milhões, resultante segundo as explicações oficiais da insuficiente dotação orçamental para pagar vencimentos à tropa e às forças de segurança (mais um malabarismo orçamental da engenharia socrática que a tropa fintou com a suspensão de pagamento dos descontos para a CGA – 5,5 milhões só da GNR), da insuficiente medida do buraco do BPN que aumentou 320 milhões, e da escavação do Bokassa das Ilhas que gastou em foguetório a massa para consertar as infra-estruturas destruídas com os temporais na Madeira e precisa de mais 280 milhões.

Se há um buraco, é preciso em primeiro lugar tentar escondê-lo e, não sendo já possível escondê-lo (demos graças ao Senhor, por isso), é preciso tapá-lo por uma de duas técnicas: despejam-se mais massas extorquidas aos contribuintes ou corta-se nas despesas, coisa manifestamente difícil porque, ao contrário da extorsão que assalta os bolsos de uma multidão desorganizada de sujeitos passivos da classe média, cortar a despesa pública mexe com os interesses das corporações, devidamente organizadas em lóbis, sindicatos e ordens, disputando lugares à mesa do orçamento.

Em alternativa a tapar o buraco com impostos ou com cortes na despesa, uma técnica que os governos portugueses têm recorrido com sucesso é chutar para a frente. Chutar para a frente tem sido feito essencialmente de duas maneiras: tratando-se de investimento público (leia-se, despesas em projectos de viabilidade económica duvidosa, na melhor hipótese, ou, na pior, despesas com elefantes imaculadamente brancos), criando PPP para desorçamentar despesas; tratando-se de receitas, como a transferência de fundos de pensões privados para a Segurança Social, um buraco grande é trocado por buracos anuais mais pequenos resultantes de responsabilidades por despesas correntes assumidas ad eternum.

O que está (por agora ?) o governo PSD-CDS a fazer para tapar os buracos orçamentais? Escudado na urgência, recorre às técnicas já testadas por governos anteriores: um mix de aumento de impostos (IRS adicional sobre o 13.º mês, IVA sobre a electricidade) e transferência de mais fundos de pensões, desta vez da banca.

Nada de novo. Salvo erro, a coisa foi falada pela primeira vez quando o BCP tentou empandeirar as suas responsabilidades por pensões em 2005 (ver este post). E segue-se a muitas outras transferências - ver aqui uma lista incompleta de 2005 à qual é preciso adicionar pelo menos a EDP e a PT (em relação a esta última ver aqui como o buraco do OE foi tapado à custa dum somatório maior de buracos nas próximas décadas).

Desta vez estamos a falar de uma transferência pantagruélica: mais de 12 mil milhões, ou quase 7% do PIB, que ofuscam os 2 mil milhões da PT. Segundo parece, desses 12 mil milhões apenas 500 milhões serão transferidos este ano e, sendo assim, o governo cria um tanque de reserva para continuar a encher os buracos a criar pelo despesismo nos próximos anos. Tudo à custa de despejar para a Segurança Social, um sistema já financeiramente insustentável, responsabilidades insuficientemente provisionadas pelas pensões mais altas deste país, as dos bancários – em relação à PT veja aqui uma estimativa da insuficiência.

Aguardo com expectativa novos desenvolvimentos e a apresentação do OE 2012.

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