Secção George Orwell
Cheguei a ter pena da antiga ministra da Educação, entalada entre um governo obcecado com a agenda mediática, sindicatos fossilizados encalhados nos direitos adquiridos, professores odiando visceralmente uma qualquer avaliação e pais esperando que os filhos que diariamente depositam nas escolas vão escorregando ano após ano até terem idade para serem funcionários públicos, caixas de supermercado ou, na pior hipótese, serventes de pedreiro. Deve ter sido para ela um inferno, ou, talvez melhor, um purgatório onde teve de penar até chegar ao céu da presidência da FLAD – Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento, uma das melhores tenças a que uma criatura pode aspirar na vida.
Passado o período de nojo, a central de manipulação accionou os mecanismos habituais de resgate das almas perdidas e conseguiu uma entrevista ao Expresso conduzida por Nicolau Santos, um pastorinho da economia dos amanhãs que cantam, actualmente em crise de fé. Na entrevista a doutora Rodrigues desenvolve a narrativa de justificação da sua acção, da qual não lembro de ter havido resultados, com excepção das maninfestações de professores que deram muito jeito àquele conhecido líder sindical para subir na hierarquia do partido.
Na entrevista nem por um momento se entrevê qualquer dúvida sobre a bondade das políticas fundadas nos equívocos habituais. Por falta de tempo e de paciência cito apenas um destes equívocos: o de, contrariamente ao defendido pelos detractores, o «nível de conhecimento das novas gerações [proporcionado pelo sistema de educação pública não] é inferior ao das gerações que as precederam» porque «em mais de 20 séculos de um contínuo de invenções, de progresso técnico e científico, de modernização social e económica, tudo indica justamente o contrário». Imagina a antiga ministra que o papel da escola é enfiar nas meninges dos infantes esse contínuo de invenções, etc. devidamente formatado pelo Magalhães? Não lhe passará pela cabeça não ser isso possível, nem desejável, e que esse «contínuo» no mundo real das escolas se resume às trivialidades do politicamente correcto e umas quantas receitas com prazo de vida limitado? Não lhe passará pela cabeça que a escola deveria ensinar os infantes a moverem-se nesse terreno árido do raciocínio e dar-lhes ferramentas mentais para poderem navegar nesse «contínuo»? Durante muitos anos o Botas foi ridicularizado por ter atribuído à «instrução pública» a missão de ensinar «ler, escrever e contar». Quarenta anos depois, os seus sucessores não conseguem atingir esse objectivo «ridículo».
Pela fixação na narrativa e incapacidade de mudar de paradigma atribuo à doutora Rodrigues cinco chateaubriands à conta dos equívocos e cinco bourbons por nada ter aprendido nem esquecido.
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