O valor de mercado dos jogadores da selecção portuguesa é superior a 200 milhões de euros, o que faz dela a 5.ª mais valiosa em todo o mundo. Porquê a 5.ª selecção mais valiosa teve as dificuldades conhecidas de apuramento para a fase final do campeonato do mundo e nesta fase final está a ter um desempenho medíocre quando se esperaria que navegasse serenamente até pelo menos aos quartos de final? Porquê os melhores jogadores do mundo são uma sombra de si próprios quando jogam na selecção?
A minha explicação é simples: tal como em todos os domínios profissionais, as leis dos grandes números tornam cada vez mais provável o surgimento de talentos à medida que o número de profissionais aumenta. Não sendo Portugal exactamente a Índia ou a China, apesar disso é muito provável, pelo menos nos domínios com maior número de profissionais, o surgimento dum certo número de potenciais talentos. Se esses potenciais talentos não se tornam efectivos devemos procurar a causa numa cultura abominante da competição e/ou na qualidade das elites e das lideranças, pelo menos no domínio das actividades colectivas que precisam dum suplemento de gestão, sejam desportos, negócios, ou outras.
No caso da selecção de futebol, o seleccionador deveria ser um gestor com elevadas competências técnicas e de liderança. Não parece ser o caso do professor Queiroz que nos últimos 20 anos, depois dos sucessos como seleccionador dos sub-20, fui acumulando flops um pouco por todo o mundo e está hoje reduzido a um cabide de fatos Armani (ver a este respeito o meu apelo de Outubro de 2008 «Come back Big Sergent, we miss you»).
Em boa verdade o que se passa no futebol é semelhante ao que se passa em todas as actividades, política incluída, onde assistimos à emergência de líderes medíocres mas espertalhões, quase sempre, e sem escrúpulos, frequentemente. A nova geração destes líderes, de que são exemplos o soi-disant professor Queiroz e o soi-disant engenheiro Sócrates, acrescentou uma nova especialidade à falta de visão, integridade e competência: o jeito para lidar com a comunicação social e os saberes manipulativos para construir uma imagem, actividade em que se esgota a sua ciência e se concentra o essencial dos seus esforços.
É por isso que a polémica sobre os salários dos gestores em Portugal se limita à argumentação irremediavelmente despeitada e invejosa e à argumentação desmioladamente teórica assente na ideia mirabolante que esses salários resultam dum mercado inexistente de gestores. Em vez de mercado temos pouco mais de um repositório de gente com jeito para equilibrar um pé na política e outro nos negócios ao colo do governo e em mercados quasi-monopolistas e de parentela com lugar garantido nas empresas de influência familiar (mesmo que algumas estejam cotadas na bolsa). A esmagadora maioria destes gestores morreria à fome se dependesse dum mercado de trabalho competitivo e, evidentemente, não se podem comparar os seus salários com os de postos supostamente idênticos em empresas internacionais. Por várias razões óbvias e uma menos óbvia: sendo eles os principais responsáveis pela desastrosa produtividade das empresas portuguesas, com a qual os próprios justificam salários dos trabalhadores entre metade e um terço dos europeus, como podem aspirar a ter salários ao nível dos seus pares?
Por falar em mercados de trabalho internacionais, deveríamos reconhecer que os jogadores portugueses de futebol são os únicos profissionais que verdadeiramente trabalham num mercado internacional competitivo sujeitos a uma avaliação constante e impiedosa. Deve ser mais fácil encontrar uma agulha num palheiro do que um gestor português integrado num mercado de trabalho internacional ao nível do mais modesto dos nossos jogadores no estrangeiro. É também por isso que quando leio os intelectuais de trazer por casa a perorar sobre o futebol e o trabalho destes rapazes desejaria castigá-los (aos intelectuais) pondo-os a competir em idênticas circunstâncias.
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