Diz a patroa que sou como os mineiros (de Minas Gerais), dou um boi para não entrar na briga e uma boiada para não sair dela. Fiquei a ruminar aquela briga dos blasfemos sobre os méritos e deméritos do estado fassista do professor Botas e lembrei-me que, a propósito duns delírios do Ivan do SuperMário durante a campanha presidencial, escrevi este ensaio sobre o fassismo:
Será preciso recordar que Salazar foi saudado pela esmagadora maioria dos que viveram a baderna republicana, entre 1910 e 1926, como um cirurgião que limpou a gangrena que corroía o tecido social e um contabilista que sabia fazer contas e pôs ordem no peditório das migalhas do orçamento? Que o fez impondo uma ditadura meio bafienta, não foi visto como um problema, pelo menos até ao fim da guerra, em 1945. Parecia mais um mal menor e necessário, comparado com o clima político-social que se vivia nessa altura na Europa continental, de Vilar Formoso até Vladivostoque. A oposição ao Botas limitava-se ao PC e a uma folclórica sucessão de conspirações falhadas em que a oposição republicana (a que, recorde-se, pertencia o doutor Soares) se embrulhava regularmente. O povo, esse, tratava da vidinha e via o Botas como um seguro contra devaneios, loucuras e assaltos à mesa do orçamento. O regime fassista mostrava contenção onde outros mostravam holocaustos e gulagues. E a coisa foi assim até ao início da guerra colonial. A partir daí e até à queda da cadeira e posterior passamento, o doutor Salazar foi de facto pouco apreciado pelas gerações que chegaram à idade da razão entre 1961 e 1968 e perceberam que iriam talvez morrer pela pátria do doutor Salazar, ainda que em quantidades relativamente moderadas face às que a baderna republicana tinha incompetentemente sacrificado na 1ª guerra - só na batalha de La Lys morreu o equivalente a mais de metade das baixas mortais na guerra colonial que durou 13 anos (7.000 e 12.000 respectivamente).
Para todos os que chegaram a idade da razão depois de 1974, o doutor Salazar, o Botas, é um cromo dinossáurico de que alguns dos cromos seus pais se queixavam nos intervalos de se queixarem do custo de vida que não lhes permitia comprar o ansiado plasma. Tudo por junto, deve haver uns 5% dos eleitores que se podem inflamar com as boutades do doutor Soares e mais 0,1% que se sentirão transportados pelos delírios do Ivan. Mesmo esta insignificância, no lugar do Ivan, eu não a consideraria como garantida, porque até a minha prima Violinda percebe que se há alguém «que se apresenta não como a solução para a crise, mas como um elemento de continuidade numa solução já existente» só pode ser o doutor Soares, que se vencesse as eleições seria o presidente de todos os situacionistas, 32 anos depois do almirante Tomás.
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