09/04/2006

DUAS ESTÓRIAS, DUAS MORAIS E UM APELO: é a Cóltura, estúpidos (again)

1.ª estória
Da última vez que aqui no Impertinências se fez a contabilidade da Casa da Música, concluiu-se que partindo dum orçamento inicial de 46 milhões de euros já se atingia 98 milhões de euros - um exemplo clássico da aplicação do efeito multiplicador do «investimento» público a que se referem os adoradores de Moloch (que saudade do Semiramis, gente).

Pois esta pirâmide do Bloco Central, iniciada há uns 8 anos e que deveria ter ficado pronta para o Porto 2001 - Capital Europeia da Cultura, ainda hoje está em obras de acabamento. Segundo o Semanário Económico, o seu custo total aproxima-se do mítico multiplicador 3 das obras emblemáticas do estado napoleónico-estalinista, atingindo já (ou será ainda?) 107 milhões de euros, verba que inclui umas obras de remodelação que custarão uns míseros 2,5 milhões, e que são obviamente indispensáveis após um intensíssimo ano de espectáculos .

É muito dinheiro? Nem por isso. «Mármores da Jordânia, cortinas da Alemanha, vidros da Espanha, borrachas de revestimento da Malásia, balcões em resina dos EUA, esponja acústica da Holanda, canóplia de Espanha, cadeiras da Noruega e sistemas de iluminação das cadeiras da Finlândia», merecem bem o sacrifício dos tansos.

1.ª moral
«Pobre gosta de luxo, quem gosta de miséria é intelectual» (atribuído a Joãozinho Trinta, um famoso organizador de escola de samba)

2.ª estória
O senhor Joe Berardo fez um acordo com o governo que o Impertinências ainda não teve ocasião de perceber, mas que à primeira vista parece consistir em usar o dinheiro dos «sujeitos passivos» para dar ao senhor Joe um local para ele arrumar as suas tralhas durante dez anos e, de caminho, lhe comprar mais uns milhões de euros de óbjectos cólturais para a sua colecção.

2.ª moral
A conquista do supérfluo provoca uma excitação espiritual superior à conquista do necessário (Gaston Bachelard)

Apelo:
Aqui fica o apelo lancinante do Impertinências ao senhor Joe Berardo, agora que já tem um armazém pago por mim, para nos poupar à visão diária, numa qualquer página dum qualquer jornal, do seu ar de mona lisa de luto, sorrindo com indulgência para a ignara plebe.

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