06/04/2006

DIÁRIO DE BORDO: não adianta pedir contas, porque eles não as sabem fazer

No texto «Incapaz, eu me confesso» muito citado nos últimos dias na bloguilha, Sérgio Figueiredo comenta o estado deplorável em que se encontra a educação pública, particularmente o ensino da matemática, que produz todos os anos incontáveis inumerados. Incontáveis porque quem os deveria contar sofre de inumeracia crónica.

Se isso não fosse, só por si, suficientemente grave por comprometer irremediavelmente várias gerações, sempre poderíamos adicionar o efeito deletério que resulta dos operários que trabalham na fábrica que produz iletrados e inumerados serem eles próprios pouco letrados e ainda menos numerados. Estamos, deste modo, prisioneiros numa armadilha que consiste no seguinte círculo vicioso: temos um ensino básico medíocre, a que inevitavelmente se segue um ensino secundário medíocre, que abastece universidades medíocres com matéria-prima medíocre que, quando pronta a entrar no mercado de trabalho, devidamente impreparada por saberes inúteis adquiridos em dezenas de cursos de ogias, a sua parte mais medíocre desagua irremediavelmente nos diversos níveis do sistema educativo onde irá garantir a perpetuação da mediocridade.

Donde resulta mais um exemplo complexo das funções zingarilho (uma patente impertinente) num espaço não-euclideano n-dimensional: quanto mais ogias, mais inumeracia/iliteracia, quanto mais inumeracia/iliteracia, mais mediocracia, quanto mais mediocracia, mais emprego no estado, quanto mais emprego no estado, mais desemprego oculto, quanto mais desemprego oculto, mais procura de ogias, quanto mais ogias, mais génios incompreendidos, quanto mais génios incompreendidos, mais esquerdismo, quanto mais esquerdismo, e por aí adiante.

Um outro exemplo, um pouco menos grave no que respeita à inumeracia/iliteracia, mas muito mais dramático pelas suas manifestações violentas que são produto cultural típico, é o sistema educativo francês. Não fossem emplastros os nossos estudantes de ogias e poderíamos ter em breve a «geração rasca», como lhe chama Sérgio Figueiredo (e antes dele? guess who), a levantar os calhaus da calçada para procurar a ocidental praia lusitana.

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