26/02/2023

CASE STUDY: Um imenso Portugal (64) - Na melhor hipótese o anúncio da moeda única foi apenas um sound bite de dois presidentes esquerdistas, na pior seria um desastre

Outros imensos Portugais
Antes de Lula da Silva, o presidente petista brasileiro, e Alberto Fernández, o presidente peronista argentino, anunciarem urbi et orbi que iriam estudar a adopção de uma moeda comum aos dois países, o primeiro deveria ter-se dado conta que a Argentina está a tentar evitar o seu décimo resgate desde a independência no princípio do século XIX, não tem reservas de divisas, tem uma inflação anual ao redor de 100%, o banco central tem a impressora a funcionar 24/24h para imprimir notas e os movimentos de capitais estão sob absoluto controlo. 

E ambos deveriam ter pedido para lhes explicarem as conclusões de Robert Mundell («A Theory of Optimum Currency Areas» de 1961) e de Milton Friedman («The Euro: Monetary Unity To Political Disunity?» de 1997) sobre zonas monetárias. Mundell demonstrou que uma zona monetária para ser óptima teria de cumprir várias condições, nomeadamente a mobilidade da mão-de-obra (inexistente no caso Brasil-Argentina), mobilidade que também exige reduzidos obstáculos culturais ou administrativas (acesso às profissões, sistemas de segurança social compatíveis, etc.). 

Friedman concluiu, a propósito da criação da Zona Euro, que uma moeda única sem as condições de uma zona monetária óptima «exacerbaria as tensões políticas, convertendo choques divergentes que poderiam ter sido prontamente acomodados por mudanças cambiais em questões políticas divisivas». 

Mais recentemente e a propósito precisamente do delírio petista-peronista, Paul Krugman sublinhou no seu Twitter uma outra condição para uma moeda comum ser viável: «pode fazer sentido entre economias que são os principais parceiros comerciais umas das outras e são semelhantes o suficiente para que não enfrentem grandes "choques assimétricos"». Ora, os principais parceiros comerciais do Brasil são a China (31%), a UE (13%) e os EUA (11%). A Argentina anda pelos 4%.

Em conclusão, o Brasil e a Argentina ao tentarem partilhar um "peso-real" acabariam a partilhar um desastre.

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