14/12/2021

SERVIÇO PÚBLICO: O regresso da inflação, a abundância de moeda em circulação, a realidade que acabará por se impor e o fim da festa à vista (ó Dr. Costa comece a procurar um lugarzito em Bruxelas)

«Os fatores que podem provocar um aumento de preços são tendencialmente em número infinito. “Se qualquer destes fatores for acompanhado de um aumento da massa monetária, haverá inflação; se tal não acontecer, não poderemos imputar-lhe essa responsabilidade.”

O aumento da massa monetária, ou da moeda em circulação, é o combustível sem o qual o aumento dos preços não poderá ganhar sustentação, acabando por retroceder (com custos, evidentemente, em que não é possível descartar a desaceleração temporária do crescimento económico, no limite, a retração temporária do PIB e do próprio emprego). Ora, como todos sabemos, moeda em circulação é o que o Mundo tem mais, hoje em dia, num processo iniciado há vários anos e intensificado, em larga escala, com o surgimento da pandemia e o aumento das dívidas públicas, financia­das pelos bancos centrais.

A pandemia foi “a cereja em cima do bolo”. Ao mesmo tempo que contraiu a produção e a oferta de bens e serviços, fez aumentar a massa monetária. Durante algum tempo, os detentores desta massa monetária dispuseram-se a pagar (taxas de juro negativas) para continuarem a detê-la, não a gastando. Entenderam ter chegado o momento de começarem a gastá-la. Temos inflação.

Encontramo-nos num momento de grandes decisões. Dando curso à tendência habitual para nos sossegarem, e nos diminuírem, infantilizando-nos, a generalidade dos políticos, alguns governadores de bancos centrais incluídos, dizem-nos que o fenómeno é passageiro, não havendo razões para alarme. Não é verdade. Ou se inicia um processo de retração da massa monetária, começando por subir as taxas de juro, ou a inflação tornar-se-á imparável. Falta decidir, e agir, se a orientação vier a ser a de assegurar a estabilidade dos preços.

À nossa escala, num registo mais prosaico, tivemos uma manifestação exemplar desta “lei de ferro” da Economia. Acompanhou a adoção do salário mínimo em 1974 — implicando um aumento salarial considerabilíssimo, que um grande número de empresas nunca poderia acompanhar e de onde só poderia resultar o encerramento de muitas destas empresas, com consequente retração do produto e do emprego.

É por isso que a imposição do salário mínimo, em 1974, obrigou à publicação não de um mas de três diplomas legais, com poucos dias de distância entre eles. O primeiro decretou o salário mínimo. O segundo decretou que, quando uma empresa não tivesse tesouraria para pagar o salário mínimo, os bancos eram obrigados a financiá-la. O terceiro decretou que, quando os bancos não tivessem tesouraria para proceder a este financiamento, o banco central era obrigado a refinanciá-los. O Banco de Portugal foi obrigado a financiar os bancos, emitindo moeda, para que estes pudessem financiar as empresas, para que estas pudessem pagar o salário mínimo decretado pelo Governo... Sem estes três diplomas, “a maionese não teria prendido” e o salário mínimo teria acabado num decréscimo mais acentuado do PIB do que acabou por ocorrer em 1974 e 1975 e num ainda maior aumento do desemprego.

Não houve desemprego mas houve inflação, reduzindo o salário mínimo, em termos reais, ao que a economia portuguesa podia comportar, nesse momento. A realidade acaba sempre por se impor.»

Excerto de O regresso da inflação, Daniel Bessa no Expresso

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