Hoje há conquilhas, amanhã não sabemos
Como alguém já disse, a única certeza que podemos ter quanto ao futuro é que não será igual ao passado. Ou então ler o Expresso onde este fim de semana se escreveu na pág. 2 do Caderno de Economia «Portugal resiste ao abrandamento europeu». Como é uma "noticiazinha" pequenina, talvez possamos dar-lhe um poucochinho mais crédito do que a célebre "notícia" de primeira página de há oito anos «FMI já vem», um mês antes da troika desembarcar.
Em todo o caso, no vosso lugar, prestaria mais atenção ao banco Nomura, para quem a coisa está a ficar parecida «com o quadro da véspera do colapso do Lehman Brothers em 2008», ou à Seaport Global, citada pela Bloomberg, para quem «rates markets globally are expecting what looks like Armageddon». Pela Zona Euro as coisas também estão tremidas com o segundo trimestre a apresentar o menor crescimento em cinco anos, E por cá até se celebra uma revisão em alta de 0,1% no segundo trimestre, revisão mais da classe de erro preditivo do que outra coisa.
E daí? Não resistimos? Sim, resistimos. E, mais do que isso, não virámos a página da austeridade? Bom, quanto a isso as opiniões dividem-se. Seja como for, o certo é que temos o hoje em valor o dobro da dívida pública das vésperas da falência do Lehman Brothers.
E daí? Não temos hoje o défice orçamental controlado? Sim, temos, e a maior carga fiscal desde a Fundação e muitos serviços públicos em paralisia, com o SNS à cabeça. E não temos a balança comercial menos desequilibrada, ao contrário de há 11 anos em que tínhamos os défices gémeos? Tivemos durante alguns anos, mas no 1.º semestre voltámos ao défice que em Junho ultrapassou 10 mil milhões de euros.
«Em defesa do SNS, sempre»
«Em defesa do SNS, sempre» foi o título de uma peça propagandística da secretária-geral adjunta do PS onde acusava o PSD e o CDS de serem «os responsáveis políticos pelo maior desinvestimento de que há memória no SNS».
Como sempre a distância entre o ilusionismo socialista e a realidade é considerável. E a realidade é «Hospital Amadora-Sintra sem anestesista para grávida», «grávidas que “saltam de hospital em hospital”», «Porto. Mais de metade das ambulâncias do INEM chegam a parar por falta de pessoal», «maternidades da região de Lisboa estão a funcionar com escalas “abaixo dos mínimos admissíveis».
Cuidando da freguesia eleitoral
Não deveria ser surpresa que os salários médios que mais aumentaram entre o segundo trimestre do ano passado e o deste ano foram os dos professores com 6%, muito acima da média de 3,4%. Vem a propósito o questionário que o governo enviou a 500 mil funcionários públicos para saber o seu grau de satisfação com as políticas deste governo e o de insatisfação com as do governo anterior. O governo resolveu suspender o inquérito perante as reacções de indignação, incompreensíveis, digo eu, pois não é natural que o governo queira conhecer o que pensa a sua clientela? Claro que é, até me recordei de uma grande empresa americana com quem trabalhei que incluía nos market principles: «know your market, know your prospect and clients».
Boa nova
Não esquecendo os stakeholders, a quem extorque com a carga fiscal mais pesada de sempre, o governo dá-lhes boas notícias para os animar. Adjudicações de obras públicas totalizando de 3,7 mil milhões no primeiro semestre que serão investidos nos próximos anos e até o anúncio no âmbito do iSimplex de um número de telefone (147) para os cidadãos tirarem dúvidas sobre serviços públicos... a partir de 2020. Só um governo como o do Dr. Costa, que tem o número de emergência com tempos de atendimento de vários minutos e serviços públicos sem capacidade de resposta, se lembraria de um telefone para tirar dúvidas.
As greves e manifs são legítimas? Depende
Greves e manifs legítimas são as que acontecem quando os socialistas e a esquerdalhada em geral estão na oposição. Quando estão no poder, a coisa fia mais fino. Greve dos motoristas dos combustíveis? Ainda por cá estivesse o governo "neoliberal" e a greve seria justíssima, não estando, a greve suscita o envolvimento directo do governo e até a ameaça de requisição civil preventiva. Manif com bloqueio na ponte 25 de Abril? Com Cavaco no governo, foi o povo em festa. Com Costa, ameaça-se mandar a polícia de choque e os cães.
As dívidas não são para se pagar, foi isto que ele aprendeu
Como em matéria de manipulação da opinião pública (na opinião publicada não há manipulação, é agitprop) Costa e o seu governo são mestres, não deve ser obra do acaso o reembolso extraordinário em Junho que fez baixar a dívida pública para 246 milhões de euros, antecipando a aplicação do novo critério do Eurostat em Agosto que faz incluir na dívida a capitalização dos juros dos certificados de aforro atirando-a para 251,2 mil milhões, um pouco acima do valor que tinha antes do reembolso extraordinário. A que se seguiu o anúncio, aparentemente despropositado, pelo Ronaldo das Finanças de que até ao final do ano seriam reembolsados adicionalmente dois mil milhões da dívida detida pelas instituições europeias.
Num país em que o Estado está endividado até ao pescoço, não admira que as empresas o estejam também e sejam maus pagadores. Segundo um estudo da D&B em média pagam as 71 dias e só uma em sete paga dentro dos prazos.
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