19/02/2018

Crónica da anunciada avaria irreparável da geringonça (123)

Outras avarias da geringonça.

Continua a celebração do "maior crescimento do século" (2,7%), feito que a geringonça se atribui, como se das reversões, reposições e restituições de «direitos adquiridos» brotassem turistas (as receitas do turismo aumentaram 16,6% em 2017) e florescessem exportações, que têm sido os factores determinantes do crescimento. E passando ao lado do facto de 19 dos 28 membros da UE, nenhum deles bafejado por algo parecido com uma geringonça, terem crescido em 2017 mais do que Portugal. E voltando a passar ao lado do facto de a CE prever que Portugal voltará a divergir em 2018 e 2019, com um crescimento de 2,2% e 1,9%, abaixo da UE e abaixo de todos os outros países com excepção da França, Itália e Bélgica.

Divergência no crescimento que poderá acentuar-se porque continuamos sem recuperar o diferencial de produtividade face à média europeia e até o estamos a agravar, visto os custos de trabalho, que já tinham aumentado 1,4% em 2016, aumentaram 2,5% em 2017. E o aumento está em aceleração porque no quarto trimestre de 2017 o Índice de Custo do Trabalho ajustado de dias úteis teve um aumento homólogo de 4,7%. Note-se que, como seria de esperar, este aumento foi maior no sector de bens não transaccionáveis que não está sujeito à concorrência internacional (aumento de 3,6% contra 1,7%).

A evolução do indicador coincidente da actividade económica do BdP, em trajectória descendente desde Setembro, confirma essa desaceleração. O mesmo se passa com o indicador de consumo, em linha com o abrandamento do crescimento do crédito ao consumo (haja Deus!) que atingiu 6,7 mil milhões e cresceu 12,6% em 2017. Abrandamento do crescimento do consumo que, ainda assim, nos coloca na posição honrosa de motor de El Corte Inglés com um total de compras de 453 milhões de euros o ano passado. É obra!

O crédito às empresas para investimento continua assim espremido entre o crédito ao consumo e o financiamento da banca ao Estado que atingiu o ano passado 47 mil milhões de euros. Quando um dia chegar o diabo que Passos Coelho viu antes de tempo (e o diabo mais tarde ou mais cedo sempre chega) a banca afundar-se-à neste mar de dívida pública com consequências parecidas às do último afundamento.

O crescimento que indubitavelmente se pode atribuir com toda a justiça à geringonça é o crescimento do número de utentes da vaca marsupial pública que voltou a subir em 2017 pelo terceiro ano consecutivo, atingindo 670 mil, mais 5,6 mil do que em 2017, nos quais se incluem quase 2 mil educadores de infância e professores do básico e secundário em contraste com a diminuição do número de alunos - entre 2011 e 2016 reduziu-se de 94 mil, ou seja mais de 10%. Enquanto isso o ganho médio mensal aumentou 1,6%.

Entretanto, a geringonça continua a navegar à vista acentuando a pecha de Portugal que, como disse o presidente da Partex, acabada de ser vendida pela Fundação Gulbenkian, «tem uma fraquíssima inteligência estratégica, pensa pouco e está absorvido pelo curto prazo». E, se já navega à vista, mais à vista vai navegar pelas tensões crescentes, agora revigoradas com a falta do inimigo externo - Passos Coelho foi à vida dele e deixou a gerência do estabelecimento nas mãos de um Rio cujo único propósito claro parece ser colocar os laranjinhas no lugar dos berloquistas.

Diferentemente dos comunistas que já estão fartos de dar para o peditório e têm os seus bastiões sindicais, os berloquistas só têm as redacções de jornais, a ILGA e as associações de estudantes e uma vontade mal disfarçada de saltarem para o governo e se sentarem à mesa do orçamento. Ao contrário, os comunistas já estão a aquecer os motores para mais jornadas de luta, como a da Frente Comum (muito gostam os comunistas de «frentes»!) que anunciou uma manif nacional para 16 de Março, Sim, não precisa de confirmar no calendário, é uma sexta-feira. Manif nacional antecedida por 4-dias-4 de greves volantes dos professores.

Nos intervalos das cativações, como 500 milhões de euros congelados pelo MF destinados a pagar parte da dívida dos hospitais aos fornecedores, o governo inventa novos impostos como as três "taxas europeias" que vai propor ao Conselho Europeu aumentando a participação no orçamento de 1% para 1,3% do PIB. Como escreveu aqui o outro contribuinte, «percebe-se a mercearia subjacente: a proporção da contribuição portuguesa para estas «taxas» será inevitavelmente menor do que a proporção dos fundos do orçamento comunitário de que Portugal espera beneficiar.  É a Óropa como mercearia

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