«Na verdade, as elites portuguesas convivem com os conflitos de interesses há séculos. A tradição dos múltiplos chapéus, da acumulação de sinecuras, da plasticidade de nomeações, das amplas portas giratórias entre o Estado e o mundo económico é, em si mesma, o cimento de uma cultura que tolera e estimula os conflitos de interesses. Isso distingue as elites inclusivas e produtivas de outras sociedades daquilo que sempre foram as nossas elites predadoras e rentistas.
Em Portugal, os órgãos sociais não executivos de uma qualquer organização são meros ornamentos de Natal (por mera coincidência da época do ano). Quanto mais bonitos (com nomes de figuras públicas conhecidas), melhor. Mas não servem para absolutamente nada. E estão longe de ter a mais mínima responsabilidade seja no que for.
Por um lado, sabemos que um capitalismo com concentração de capital (como é a tradição portuguesa) não requer estruturas de governança com fiscalização ou supervisão (porque não há disseminação de autoridade que justifique os custos de uma governança complexa). Por isso, os órgãos sociais não executivos não foram uma invenção local, mas mais uma importação para ficar bem na fotografia europeia. Por outro lado, dominados por uma cultura profundamente não confrontacional (qualquer crítica é sempre um insulto pessoal) e elites cooptadas (em vez de concorrentes), os órgãos sociais não executivos encontram um terreno árido e hostil para exercer o papel para que foram criados. A cultura das elites portugueses sempre apreciou mais o "entrar mudo e sair quedo".»
As lições raríssimas, Nuno Garoupa no DN
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