04/09/2017

ESTADO DE SÍTIO: Habituem-se (12) - Perpétuo é manifestamente exagerado. Talvez duradouro

Outros Habituem-se

«Esta fórmula [a geringonça] de poder perpétuo, que tem tudo para funcionar, impõe três lições sobre este novo tempo político. A primeira é que se tornou consensual que o verdadeiro poder político não está no parlamento – se estivesse, o PS ficaria entusiasmado pela possibilidade de obter uma maioria absoluta e libertar-se dos parceiros à esquerda. Ou seja, assume-se que, num país centralizado e pendurado no Estado, o controlo da máquina estatal define quem detém o poder. E, nesse sentido, o PS sozinho nunca conseguiria esse domínio, ficando nas mãos sindicais da CGTP ou dos sectores da administração central controlados pelo PCP e pelo BE, que bloqueariam as suas iniciativas. Ora, num contexto de geringonça, todas as portas se abrem.

A segunda é o reconhecimento utilitário de que, tendo PCP e BE ao seu lado, o PS esvazia a oposição política a um governo seu. Desde logo, pelas razões óbvias: os partidos mais à esquerda gerem a “rua” e definem os níveis de contestação social, podendo impor o caos ou estabelecer a paz. A “descrispação” que Marcelo saudou como vitória política resulta artificialmente desse monopólio da contestação social que PCP e BE detêm – ou seja, o ambiente social é gerado pelas conveniências desses partidos e tê-los do lado do governo é proteger o PS do desgaste da governação. Além disso, no debate parlamentar, durante décadas perdurou o entendimento de que a oposição estava a reboque de PCP e BE, partidos de protesto cuja especialidade era sovar ministros no plenário da Assembleia da República. PS e PSD habituaram-se a fazer oposição de mãos nos bolsos, à espera que chegasse a sua vez de regressar a São Bento. Ora, agora que PCP e BE trocaram as críticas ao governo pelas ovações, a direita ficou dependente de si própria na luta parlamentar – e não sabe o que fazer.

A terceira lição é que o tempo das reformas acabou. (...)

Entender que, sendo a geringonça uma força de bloqueio, a direita tem a oportunidade de se assumir como motor reformista do país – e, portanto, formar alternativa na apresentação de ideias inovadoras por sector, com bons think tanks ou até um governo sombra. E aceitar que, no contexto parlamentar, terá de começar a sujar as mãos e trabalhar mais. Já era tempo.»

«A fórmula do poder perpétuo»,  Alexandre Homem Cristo no Observador

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