A beleza de uma democracia, mesmo meio asmática, como a nossa, com uma mídia relativamente livre, ainda que impregnada pelo jornalismo de causas e atrelada a interesses corporativos variados, como a nossa, é, como o tio Abraão descobriu, «pode-se enganar a todos por algum tempo, pode-se enganar alguns por todo o tempo, mas não se pode enganar a todos sempre».
Seria isso que Costa, caso lhe restasse um módico de lucidez e integridade, estaria prestes a descobrir a propósito do caos da resposta do seu governo ao incêndio de Pedrógão Grande que após duas semanas de spin e manipulação pura e dura está a vir à tona.
Precisamente no Expresso, ultimamente o semanário de reverência, a quem desta vez deu um ímpeto de investigação jornalística e dedicou uma dúzia de páginas aos factos (páginas salpicadas aqui e ali por escritos encomendados para limpar folhas) que, pouco a pouco, vão emergindo das profundezas do Estado assistencialista falhado que o PS, com ajuda variável do PSD e do CDS, tem vindo a construir. E o que mostram esses factos? Mostram que o Moloch estatal que consome metade da produção do país é uma máquina ineficaz e ineficiente vocacionada para proporcionar empregos e tenças a indivíduos e rendas a corporações. Não vou repetir as dezenas de factos relatados. Vou citar apenas um: duas estações móveis que custaram meio milhão de euros e permitiriam substituir antenas do SIRESP destruídas pelos incêndios estão desde Janeiro de 2016 à espera de uma ligação satélite.
Uma leitura atenta desses factos comprova algo que só os mais distraídos ainda não perceberam: a estratégia adoptada pelo governo de «reposições» e «reversões» em matéria salarial e, apesar disso, cumprir o défice à custa de cativações e de cortes da despesa de investimento, está a deixar à beira da paralisia uma parte significativa do aparelho de estado.
Outro indício da decomposição do Moloch estatal foi o misterioso desaparecimento de armas e munições dos paióis de Tancos. E se essas armas e munições vierem aparecer num atentado terrorista? Será a certidão de óbito do Estado assistencialista falhado.
Enquanto o Estado se afunda na confusão, o que faz o primeiro-ministro Costa, além do spin e de orquestrar a manipulação dos mídia? «Pede a ‘focus group’ uma avaliação de popularidade após incêndios» e suspira de alívio porque «os portugueses estão a compreender a posição do primeiro-ministro e não o culpam pelas falhas do Estado». Não conheço nenhum português que estivesse no focus group, mas, não havendo falta de patetas, imagino que não seja difícil compor um grupo com uma maioria deles.
Com Estado ineficaz, ineficiente e capturado por todo o tipo de corporações, o simples bom senso conduziria a não o deixar alastrar. Bom senso não é coisa que abunde e talvez por isso «o governo entendeu-se com o Bloco de Esquerda para acabar com a liberalização do eucalipto e integrar compulsivamente no Banco Público de Terras os terrenos abandonados e sem dono».
Um dos temas recorrentes nestas crónicas é a evolução da poupança das famílias que até o semanário de reverência descreve com um título que não poupa nos adjectivos: «Poupança das famílias colapsa no primeiro trimestre» a que junta o diagrama abaixo que dispensa comentários.
Não admira o «colapso» porque os consumidores acariciados pelos afectos marcelistas e a enxurrada de boas notícias subirem aos céus - o índice de confiança atingiu o valor mais alto desde 1997 época em que governava por cá um dos mentores de actual primeiro-ministro, ele próprio especializado em dar boas notícias e empurrar as outras com barriga ou para debaixo do tapete.
A juntar ao consumo que «colapsa» a poupança, coisa vista entre nós como prelúdio da derrapagem das contas externas e das contas públicas (desta vez mais das segundas do que das primeiras, porque o governo cavalga a onda da recuperação da economia europeia e mundial) temos mais um dos ingredientes habituais: a construção está a puxar pela economia reconhece o FMI.
Entre as "boas notícias" em que o governo produziu para literalmente apagar o incêndio de Pedrógão Grande, talvez a mais ridícula tenha sido a da criação, em conjunto com a Índia, de um fundo de quatro milhões de euros para ciência e tecnologia (não é engano, são €4.000.000 ou 0,17% da despesa anual de I&D). Outras notícias recorrentes são as antecipações do pagamento da dívida ao FMI em que cada pagamento é anunciado como intenção, como previsão e várias vezes depois como realizado (veja-se esta retrospectiva deste ano). A semana passada foi anunciado o pagamento de mil milhões já anunciado antes e antecipados os previstos para Julho e Agosto (1,25 mil milhões em cada mês). Com tanto anúncio de pagamento, os eleitores mais distraídos já devem estar a pensar que estamos a emprestar dinheiro ao FMI.
Entre os sinais cada dia mais frequentes de distanciamento do PCP, à medida que crescem as intenções de voto no PS, destaco a boutade de Jerónimo à saída de uma reunião do Comité Central, «é cada vez mais visível a convergência» do governo com o PSD e o CDS disse sem se rir. E também os anúncios de greves. O Sindicato Nacional dos Farmacêuticos anuncia uma greve para 18 e 19 de Julho e por tempo indeterminado a partir de 1 de Agosto por «rompimento unilateral dos compromissos assumidos pelo governo». E, por falar em farmacêuticos, a dívida do SNS à indústria farmacêutica aumentou 18,5% até Maio e cerca de 72% dessa dívida tem mais de 90 dias.
Creio que falta a palavra «verdade» no post.
ResponderEliminarComeço a tropeçar, demais, com «asmática/o» nos vossos post. Alguém sofre de asma, por aí?
A frase é assim: You can fool some of the people some of the time and all of the people some of the time, but you can’t fool all of the people all of the time.
Estais a precisar de vacances.
Abraço