Devido ao incêndio na cozinha do (Im)pertinências, esta crónica atrasou dois dias e era para ficar um pouco mais comprida do que é habitual e o habitual já é comprido - pelo menos quando comparado com o os tweets do Donaldo. Para evitar indigestões dos fregueses cortou-se na dose.
Começo por mais um escândalo do regime, típico da promiscuidade do que se poderia chamar o bloco central informal dos negócios, um zingarelho com algumas semelhanças com a geringonça, a quem devemos uma parte substancial do apodrecimento do regime. Trata-se do caso dos CMEC da EDP que no mesmo pote mete pelo lado dos peões Mexia, Pinho e Sócrates, entre outros figurões, e pelo lado dos bispos corporativos o GES com o omnipresente DDT Ricardo Salgado. Muito provavelmente a operação em curso que já tem como arguidos Mexia e Manso Neto - aquela criatura com ar de sem abrigo de quem dizem ser muito competente - vai ficar em águas de bacalhau. Se não ficar, abro uma garrafa da viúva Cliquot para comemorar com a patroa.
Deveria ser evidente para toda a gente, mas não é, que não há democracias dignas desse nome sem instituições credíveis. Daí o esforço, frequentemente bem sucedido, dos vários governos que nos desgovernaram para anularem ou descredibilizarem as instituições que lhes tolhem os movimentos. Veja-se o caso do CFP e da sua presidente Teodora Cardoso que tem vindo a iluminar a escuridão orçamental socialista. Surpreendentemente, um outro Conselho, o Conselho Económico e Social (CES), presidido por Correia de Campos, um socialista encartado, deu um ar da sua graça e num parecer sobre o Programa Nacional de Reforma, uma obra de ficção do governo de Costa, denuncia a «omissão de um conjunto de problemas de fundo» e o esforço de «tentar demonstrar que estamos a atingir a anormalidade». Bem-vindos ao clube.
Continuando nas surpresas, o Expresso, o semanário de reverência, publicou no seu número de 29 de Maio um artigo («Ministros viciados nos fundos») de Joana Mateus citando a revelação, antes feita por uma newsletter de 16 de Maio do PSD, de mais um expediente de desorçamentação, a saber: o financiamento de salários da função pública e outras despesas correntes com fundos europeus. Dos 20 projectos com maior financiamento pelo Portugal 2020 há um único investimento empresarial da papeleira The Navigator Co, no meio de habilidades para usar os fundos europeus no pagamento de estágios promovidos pelo IEFP. É a execução orçamental socialista, senhores.
Passando das surpresas para o campo da prestidigitação, segundo o INE, o aumento de 3,2% do rendimento bruto das famílias em 2016, muito badalado com uma grande realização da Nova Política Económica (Novaya Ekonomiceskaya Politika), foi ultrapassado pelo aumento dos impostos directos pelo que o rendimento líquido diminuiu. É claro que, diferentemente, o rendimento dos funcionários públicos presumivelmente aumentou na generalidade dos casos, mas, compreenderão, é preciso segurar a clientela. Não espanta que pela redução do rendimento líquido e pelo clima afectuoso que vivemos (os indicadores de confiança dos consumidores atingiram o máximo desde 1997), a taxa de poupança se tenha reduzido para 4,4% o que para a Mouse School of Economics não tem problema nenhum porque os amanhãs sempre cantarão, apesar do aumento do produto depender do investimento e do investimento depender da poupança.
Há alguns sinais de que a estratégia preconizada pela Mouse School of Economics de pôr o consumo a puxar pela economia está finalmente a resultar... na economia dos nossos parceiros que nos vendem quase tudo, principalmente automóveis, cujas vendas voltaram a mostrar grande dinamismo: aumento de 13,4% em Maio relativamente ao ano anterior e 7,4% nos 5 primeiros meses.
Não só se estão a animar os animal spirits, como lhes chamou de Keynes, dos consumidores (aliás, os espíritos do John Maynard não eram só nem principalmente os dos consumidores, mas os dos empresários e investidores). Em ano de eleições, as câmaras municipais (que substituem os empresários na economia da Mouse School) aumentaram em quase 10% as despesas, mais 7% do que as receitas, engrossando a dívida pública que, não obstante todos os outros sucessos, é o maior sucesso da geringonça.
É um sucesso tão grande que foi atingido um novo recorde de 247,5 mil milhões (mM) ou 130,6% do PIB, dos quais mM detidos pelo BdP. Como é que foi possível com «défices ditos pequeninos» aumentar 17,6 mM em 16 meses contra 9,7 mM do governo anterior no mesmo período, é um mistério semelhante ao do défice de 2009 que começou por ser 2% e acabou em 10%. Vejamos o belo aspecto da coisa:
Jornal Eco |
Um dos expedientes para aldrabar o défice em contabilidade pública (que, não sendo o mesmo do défice em contas nacionais, que é o mais importante para efeitos de Bruxelas, serve perfeitamente para enrolar os parolos que lêem os jornais portugueses) e chutar para a frente os pagamentos e aqui temos mais uma excelente performance de Costa-Centeno. Segundo o Relatório Europeu de Pagamentos 2017 da Intrum Justitia, o governo português é o segundo mais lento a pagar, depois do governo grego ocupado pelo Syriza, partido irmão do BE e muito admirado por Costa.
Entretanto, começam a emergir os efeitos perversos da tão celebrada saída do Procedimento de Défice Excessivo. Um deles é a redução da flexibilidade orçamental para financiar reformas estruturais, que muitas vezes corresponderam apenas a despesas correntes - veja-se o caso relatado acima da utilização dos fundos europeus. Segundo o Negócios, estão em causa quase 950 M, Outro efeito é que desaparece o álibi do PS para adormecer os comunistas e os bloquistas, que desataram logo a querer sangrar o porco. Sobretudo os primeiros, que trataram de organizar manifs, a primeira da CGTP no sábado passado e a segunda dos professores já anunciada para o dia 21 - dia de exames. Por razões à primeira vista difíceis de perceber e à segunda vista claríssimas, os mídia do regime que se excitaram com a mais pequena manif contra o governo de Passos Coelho mostraram o maior comedimento ao noticiar o evento.
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