«“Trata-se de uma grande vitória para Portugal”. Quem disse isto? Não, não foi este mês de Maio de 2017. A declaração é do ex-primeiro-ministro José Manuel Durão Barroso, a 28 de Abril de 2004, quando anunciou a saída de Portugal do Procedimento por Défices Excessivos (PDE) em que tinha entrado em 2002.» Recordou Helena Gameiro, a propósito do embandeiramento em arco que assaltou os prosélitos mais excitáveis da geringonça e que curiosamente, mas não estranhamente, deixou Costa a fazer exercícios de prudência.
Prosélitos que distraidamente se embeveceram com «o Ronaldo do ECOFIN» de Schaüble a propósito de Centeno, boutade que é a confirmação de que o governo socialista suportado pela geringonça está a adoptar as políticas que combateu, o que seria positivo se não fosse uma deriva absolutamente oportunista a deixar cair na primeira curva.
A realidade não se comove com o optimismo bacoco dos prosélitos e aí está a evolução da dívida para o comprovar. Segundo a Nota do BdP, o endividamento total do sector não financeiro voltou a aumentar 1,2 mil milhões de euros em Março. Como se pode ver nos diagrama seguintes, depois de uma redução nos anos da intervenção da troika, o endividamento público e privado quer das famílias quer das empresas retomou a sua tendência.
E as agências de rating também não se comovem. A Fitch, reconhecendo que melhorou o controlo das contas públicas mantém a notação e prevê o aumento do défice para 2,8% este ano devido à recapitalização da Caixa que contribuirá com 1,1%. Já a CE faz o costume e dá uma no cravo e outra na ferradura suspendendo o PDE ao mesmo tempo que avisa para o risco das regras orçamentais não serem cumpridas, pois... segundo a análise técnica, Portugal falhará todas as regras pós-PDE que são naturalmente mais exigentes agora que o doente saiu dos cuidados intensivos.
Já que falamos da falta de fé, acrescente-se a do BCE que vê aumentar os riscos de sustentabilidade da dívida pública pelo facto de entre 2016 e 2018 as taxas de juro serem superiores às taxas de crescimento da economia.
É que a falta de fé tem mais terreno de sustentação do que a fé, como se vai vendo por alguns indícios. Nas administrações públicas o défice até Abril aumentou 314 milhões de euros nos primeiros quatro meses deste ano, devido ao aumento dos reembolso de IRS e IVA e ao crescimento de 1,4% da despesa, o que mostra a fragilidade da engenharia orçamental socialista.
Se a essa fragilidade juntarmos a qualidade das políticas económicas e a ausência de reformas estruturais - ou mais exactamente a adopção de contra-reformas - temos a prazo uma receita para o desastre. Veja-se o quadro seguinte preparado por Avelino de Jesus com «um panorama sintético das políticas económicas relevantes e os consequentes desempenhos macroeconómicos».
Clicar para ampliar [Fonte: «Crescimento: aparição ou visão?»] |
Registe-se um acontecimento, aparentemente insignificante, revelador de como a geringonça (e acrescente-se, por desvelo pela verdade, também a oposição) vê a «investigação». Num país que não estivesse sufocado pela omnipresença de um Estado tutelar e sufocante, criador de direitos adquiridos, fazer-se-iam talvez leis sobre a investigação. Em Portugal faz-se uma lei do emprego científico. Do emprego, tomem nota.
Quanto à vida conjugal da ménage à trois já viu melhores dias com o PCP a perceber cada vez melhor que está a ficar para trás nos amores de Costa e a começar a puxar dos galões sindicais, como mostrou a greve de sexta-feira. Greve que segundo os próprios foi um sucesso com uma adesão geral de 75% e 90% na Saúde e Educação (qualquer greve de funcionários públicos está sempre garantida e à sexta-feira é um sucesso). Em qualquer caso, até agora Costa pôde contar com a «paz social»: apenas 19 greves contra 36 de Passos Coelho no mesmo período. A diferença é ainda mais esmagadora no sector de transportes (2 contra 24) onde o PCP tem um controlo absoluto.
É possível que a «paz social» tenha os dias contados e seja substituída, não uma guerra aberta que aos comunistas também não convém, mas por uma guerrilha para o PCP fazer prova de vida perante a sua clientela. Leia-se o que Ana Avoila disse ao jornal SOL: «o descontentamento mostrado nesta resposta (a greve de sexta-feira) é muito grande e o Governo tem de saber ler por um razão simples: os funcionários da função pública ajudaram a derrubar a maioria absoluta do antigo Governo e criaram expectativas». Não podia ser mais clara.
Para fechar esta crónica, evoco dois factos na semana passada no desempenho de Costa como propagandista-em-chefe: (1) o exercício de pós-verdade sobre a redução da dívida da câmara de Lisboa enquanto ele por lá andou. um exercício que antecipou os exercícios que em S. Bento tem feito e (2) o ter-se esquecido que o governo já não é accionista há vários anos da PT (recorde-se que foi vendida para pagar a dívida deixada pelo governo de Sócrates em que Costa foi Ministro de Estado) e ter arrotado o sound bite «o governo não dará qualquer autorização» para a Altice fazer despedimentos na PT, como se esta fosse a CP ou o Metro e dependesse de autorização do governo para despedir de acordo com a lei.
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