Recordo que a doutrina Somoza, segundo o Glossário das Impertinências, foi pela primeira vez formulada pelo presidente Franklin Delano Roosevelt em 1939 ao explicar o apoio americano ao ditador Somoza com palavras que ficaram célebres: «he may be a son of a bitch, but he's our son of a bitch».
Todos os dias poderia fazer uma lista de exemplos desta doutrina e não faço. Faço hoje com alguns exemplos, todos mais ou menos ligados à magna questão que começou com a grandiosa vitória do Syriza com 2,2 milhões em 6,2 milhões de votos expressos (36,34%) e 9,9 milhões de votos possíveis (22,7%), elegendo 49,7% dos deputados e tendo um bónus de 50 lugares como partido mais votado.
O que é intolerável humilhação?
Dizer aos gregos que se querem mais dinheiro têm de aceitar condições que o seu governo rejeitou; governo que decorridos cinco meses convocou um referendo para rejeitar outras condições piores do que as primeiras, propôs novas condições piores do que as segundas e acabou a aceitar quartas condições piores do que as terceiras. E continua a ser uma humilhação mesmo quando o governo grego apresentou internamente o acordo final como um bom acordo.
O que não é humilhação?
Ministros gregos chamarem aos credores por exemplo «terroristas» (ministro das Finanças) ou «chantagistas brutais e assassinos financeiros» (ministro da Energia).
O que é intolerável interferência na livre escolha dos eleitores?
Uma luminária bruxelense recomendar aos gregos que não escavaquem o país votando «não» num referendo.
O que não é interferência na livre escolha dos eleitores?
Avisar os eleitores que «se votarem em partidos que não respeitam os princípios fundamentais da União Europeia, isso afectará as relações com os outros países», como fez em 2000, António Guterres (ver aqui no Blasfémias).
O que é um político a vangloriar-se ridiculamente?
O primeiro-ministro dizer que deu um contributo para se chegar a acordo durante as discussões em que participou com a Grécia e ser ridicularizado por remas de patetas no hashtag poracasoaideafoiminha (sobre o contributo ver o post anterior e ler este artigo do irmão do futuro primeiro-ministro de Portugal)
O que não é um político a vangloriar-se?
A vice-presidente do Grupo Parlamentar do PS dizer que o acordo «só foi possível graças ao forte empenho dos socialistas, que uniram esforços, construíram pontes e demonstraram capacidade negocial em todos os momentos», empenho a 2 mil km de distância e 3 horas de voo.
Também falta explicar como pode o PS vangloriar-se de ter ajudado ao acordo se o resultado deste acordo é uma austeridade exacerbada a que sempre se opôs? É mais um ziguezague na deriva oportunista de Costa.
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