18/02/2015

SERVIÇO PÚBLICO: Alguns factos e opiniões desalinhadas sobre o resgate da Grécia


«A realidade tem sempre o problema de estragar algumas supostas boas ideias revolucionárias. Uma delas é a pequena utopia de que um eleitorado de 10 milhões de habitantes de um país que tem a evasão fiscal e a pequena corrupção bem impregnada no seu dia-a-dia iria mudar o rumo político da União Europeia. Outra, que é a versão da mesma moeda, é a fantasia de que um país que já vai no segundo programa de resgate financeiro sem cumprir acordos básicos poderia convencer os seus credores a perdoarem boa parte da sua dívida. A Grécia, que já teve direito a privilégios que Portugal e a Irlanda não tiveram, virou-se para a extrema-esquerda para pressionar a Europa mas teve um choque frontal com a dura realidade: não há almoços grátis.

Ontem o Eurogrupo mostrou aos gregos que o seu voto não tem mais valor do que os votos dos restantes países europeus. Um país não vale mais do que 18 – é uma aritmética simples que escapa ao raciocínio dos revolucionários amigos do Syriza. Muito menos quando a Grécia suspendeu uma avaliação da troika e quer cometer a pequena loucura de recusar a próxima tranche quando fica sem dinheiro daqui a 15 dias.»

Luís Rosa no Jornal i

«Com os seus mercados tradicionais a crescer e os salários fortemente reduzidos, as exportações gregas não crescem.

Em preços constantes de 2010, em 2008 as exportações da Grécia eram de 58,9 biliões de euros e as portuguesas 54,7 biliões de euros. Em 2014 as posições estão invertidas: as gregas são 55,8 biliões de euros e as portuguesas 65,5 biliões de euros. Por todo o lado (veja-se a tabela anexa) as exportações estão, após o tombo pós-crise, em franca recuperação. A Grécia é das poucas excepções.

De facto, as reformas estruturais desenhadas no papel pela Troika não foram implementadas. Continuam as dificuldades burocráticas nas exportações. O controlo do Estado e das corporações parasitárias sobre a economia continua forte, em particular as restrições no mercado de produtos que se estendem à exportação. Apesar da elevada despesa pública, não conseguiram construir um Estado social decente. Por exemplo, ainda andam às voltas para implementar o elementar rendimento mínimo.

O problema grego não está na governança das instituições europeias, mas na grega.

As facilidades obtidas pelo governo grego, em tão elevado montante e durante tanto tempo, justificariam outros resultados, tanto no plano económico como no social.»

Avelino de Jesus, professor do ISEG, no Jornal de Negócios

«Uma diferença fundamental reside nos fundamentos económicos. Ao longo dos últimos dois anos, outros países periféricos da Zona Euro têm provado a sua capacidade de ajustamento, ao reduzirem os seus défices orçamentais, aumentarem as exportações e registarem excedentes em conta corrente, negando, assim, a necessidade de financiamento. Na verdade, a Grécia é o único país que tem constantemente arrastado os pés sobre as reformas e registado um péssimo desempenho ao nível das exportações.

Na verdade, as exigências do governo grego baseiam-se num mal-entendido. Para começar, o Syriza e outros argumentam que a dívida pública da Grécia, de 170% do PIB, é insustentável e deve ser cortado. Dado que a dívida oficial do país constitui a maior parte da sua dívida pública global, o governo quer vê-la reduzida.

Contudo, os credores oficiais da Grécia concederam-lhe períodos de carência bastante longos e taxas de juros bastante baixas, pelo que o encargo é suportável. A Grécia gasta menos com o serviço da dívida do que a Itália ou a Irlanda, sendo que ambos os países têm rácios (brutos) da dívida em relação ao PIB muito mais baixos. Com os pagamentos da dívida externa da Grécia a representar apenas 1,5% do PIB, o serviço da dívida não é o problema do país.

O custo relativamente baixo do serviço da dívida também anula as justificações do Syriza para apelar ao fim da austeridade. O último programa de resgate da "troika" (Fundo Monetário Internacional, BCE e Comissão Europeia), iniciado em 2010, prevê um excedente primário (que exclui o pagamento de juros) de 4% do PIB este ano. Isso seria um pouco mais do que o necessário para cobrir os pagamentos de juros, o que permitiria à Grécia começar finalmente a reduzir a sua dívida.»

Daniel Gros do Centro de Estudos Políticos Europeus, no Jornal de Negócios

1 comentário:

  1. "Uma delas é a pequena utopia de que um eleitorado de 10 milhões de habitantes."

    10 milhões não mas cerca de 2.246.064 votantes no syriza.

    não pensemos que todos os Gregos estão contentes!

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