09/05/2014

Um governo à deriva (16) – Não entregaram a carta a Garcia e dão outro tiro no pé

«Não é a primeira vez que o governo se deixa enredar nas suas próprias armadilhas (leia-se estratégia decisão e de comunicação), a carta de intenções que esteve para ser um mini-memorando e que ainda nem sequer estará negociada com o FMI, é mais um exemplo, desnecessário, de uma trapalhada que só serve para criar ruído a vinte dias das eleições europeias.

Quando o Governo anunciou o fecho da 12ª e última avaliação da ‘troika', disse tudo o que tinha de anunciar, as (não) reformas, o aumento de impostos, a devolução de salários e pensões no Estado. Mas não disse, e deveria ter dito, que um memorando teria sempre de ter um documento de encerramento, em particular com uma entidade não europeia que continuará a ser credor do País por muitos e bons anos e não tem capacidade de vigilância das decisões de política interna como o BCE e a Comissão Europeia, ao abrigo dos novos regulamentos comunitários.

Qual é, então, o problema? É um problema de credibilidade, que o Governo voltou a desvalorizar, como desvalorizou as promessas de não aumento de impostos e o anúncio do agravamento da TSU e do IVA. Não são aumentos marginais, nem decimais, são centenas de milhões tirados à economia privada para financiar uma decisão política de mais despesa pública. Apesar disso, o problema é outro, é de princípio.

Agora, com a carta de intenções, tudo indica idêntica à que a Irlanda também assinou, os portugueses desconfiam. É razoável que o façam, tendo em conta o que se passou nas últimas semanas. Por isso, o Governo deveria matar o assunto, divulgando a dita carta assim que estiver negociada e fechada com o FMI. Se a 12ª avaliação já fechou, e todos a deram como concluída, o que falta? Se não o fizer, será necessariamente uma pedra no sapato, um elefante no meio de uma sala, a da campanha eleitoral para as europeias.»

António Costa, no Económico

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