Fascículos anteriores: (1), (2), (3), (4), (5) e (6)
[Em rigoroso exclusivo, o (Im)pertinências continua a publicar em fascículos o paper «Teoria Geral da História de Portus Cale e Arredores à luz do Axioma de Sócrates-Passos» do detractor e amigo Pai Silva.
Nos fascículos anteriores foi tratada a axiomática, abordada a fundação de Portus Cale, tratados os protagonistas fundadores e os seus herdeiros menos imediatos até àquele que um dia deverá regressar embuçado. Neste fascículo este vosso Impertinente não conseguiu identificar o tema – trata-se aparentemente apenas de um delírio do Autor, muito conforme com os tempos que atravessamos.]
Uma vez atirados os portucalenses ao buraco, os sucessores legítimos ou ilegítimos (pouco interessa) fizeram o possível e o impossível para os manter lá bem sossegadinhos. O império que se tinha construído e até lhes permitira sair do buraco anterior, lentamente esboroava-se em proveito de todos menos dos sucessores que, irreflectidamente, o deixaram cair nas unhas afiadas e gananciosas de ingleses holandeses e franceses. Finalmente parecia que aos nuestros hermanos as favas estavam contadas. Não era bem assim e mais uma vez lá cometeram o erro de contarem mal as favas. Dificuldade de cálculo benfazeja pois a ela deve agradecer-se a invulgar sobrevivência do condado.
Além de fazerem mal a contagem das favas, os miúdos do lado desconsideraram ou, ainda pior, ignoraram (mal avisados por certo) uma característica única dos portucalenses: uma capacidade infinita para a traulitada desde que se consigam convencer, a bem ou a mal, de que isso é útil ou dá resultado mesmo não sendo útil ou, simplesmente, é divertido como o caraças. E assim, em 1640 andavam os portucalenses ao chuto a tudo quanto cheirava a Castela particularmente o que tinha a configuração de homem, mesmo que não fosse castelhano.
É claro que se estava no buraco e não era o facto de se assestar com uns pontapés no traseiro do espanhol que saímos dele. Isso iria demorar bastante mais tempo. Importa perceber porquê.
Na altura não existiam os fabulosos mercados que hoje nos rodeiam por todos os lados como se fossem um mar e nós umas ilhas, em alguns casos, poucos, paradisíacas e noutros, a maioria, uns calhaus desolados. Mas se nos dessem a honra de existirem e tivessem a condescendência de olhar para o condado não apostariam um real no dito condado. Ou seja, e por outras palavras, o condado estava feito. A explicação para tão inesperado desfecho tem a ver com os princípios do fim do Império Católico. Em 1517 o senhor Martinho resolveu aborrecer o Papa de serviço por causa de um magnífico negócio do qual ele, Martinho, e toda a suserania a que pertencia não abesava nada: as famosas e mirabolantes indulgências.
A indulgência era uma espécie de salvo-conduto para o outro mundo: um malandro ou bandido, neste mundo, poderia sentir-se com dúvidas sobre o que lhe poderiam estar reservado quando batesse a bota, caso tivesse cometido (e mesmo que não tivesse mas fosse no fundo um malandro ou um bandido) alguma ou muitas espécies de malandragens ou banditagens, coisas que a Santa Madre traduz por pecados. Para resolver as suas dolorosas dúvidas e incertezas dirigia-se a uma delegação do senhor Papa de serviço que, dependendo da importância do malandro ou do bandido, podia ser um bispado se o potencial adquirente fosse de alto gabarito ou um abade mostrar-se-ia o suficiente se não passasse do equivalente a um rato de automóveis dos dias de hoje; o potencial adquirente abria os cordões à bolsa e transformava-se em adquirente de facto e de jure comprando uma indulgência pelo preço especificado na detalhada tarifa na posse de todos os agentes e funcionários do Império Católico. Com esse salvo-conduto no dia do juízo final daquela encrenca já estava livre.
(Continua)
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