A semana passada, a propósito do décimo aniversário da intervenção da coligação liderada pelos EU no Iraque, a imprensa portuguesa divulgou o número de mortes de iraquianos estimado em 120 mil pelo Iraq Body Count. Entre outros, os seguintes jornais trataram o assunto: Expresso, Público, Diário de Notícias, Sábado.
Para sermos rigorosos, devemos considerar serem menos de 14 mil as mortes devidas às acções directas da guerra - as verificadas no 1.º ano da intervenção. Os restantes 90% são mortes causadas pelos conflitos políticos e religiosos internos, nomeadamente resultantes das rivalidades chitas-sunitas.
Contudo, se queremos considerar todas aquelas 120 mil mortes como provocadas pela intervenção, teremos que considerar igualmente que nos 23 anos anteriores a brutalidade do regime de Sadam Hussein, apeado por essa intervenção, foi responsável por 500 mil mortes só do lado iraquiano na guerra de 8 anos Iraque-Irão, a ocupação e libertação do Kuwait causou cerca de 100 mil mortes e o gulag iraquiano montado pelo regime pode ter atingido cerca de 200 mil (estimativas do prémio Pulitzer John Burns, publicadas no NYT antes da intervenção). A ser assim, a intervenção no Iraque teria causado uma média de 12 mil mortes por ano contra uma média de 35 mil nos 23 anos anteriores.
Evidentemente esta contabilidade mórbida não pode justificar a posteriori uma intervenção militar cujo móbil foi baseado na ficção de inexistentes armas de destruição maciça. Mas, querendo-se ir por aí, como o anti-americanismo disfarçado de anti-bushismo gosta de ir, terão que contar-se as vidas poupadas pelo fim de um regime por quem esse anti-americanismo sempre nutriu mal disfarçadas simpatias.
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