Nos primeiros tempos como primeiro-ministro António Guterres aparecia todos os dias nos primeiros minutos dos telejornais a debitar um sound bite, frequentemente apenas um balão-sonda para ver como reagia o povinho, ou, mais precisamente, como reagia a corporação dos comentadores oficiais e dos jornalistas de causas. Com este débito regular, inaugurou uma fórmula com bastante sucesso na corporação, logo de seguida copiada pelo seu sucessor José Sócrates, com ainda maior sucesso, possivelmente pela ousadia na retórica, amiudadamente temperada com a mentira pura e dura.
A coisa era tão notória que Vasco Pulido Valente baptizou Guterres de «picareta falante» muito a propósito. A saída de Guterres da cena política doméstica não deixou um vácuo porque a natureza detesta o vácuo e surgiram desde logo inúmeros candidatos. Entre eles o maior de todos: o professor doutor Marcelo Rebelo de Sousa que ilumina com igual prolixidade e vacuidade as noites de domingo com os seus comentários e apreciações a dúzias de livros que vão desde a cozinha macrobiótica até à física quântica, passando pela filosofia, a história e o romance de cordel. Durante a semana inunda-nos com os seus recados e declarações em todas as incontáveis conferências, colóquios, premières, apresentações, vernissages, onde comparece.
Pois bem, por tudo isso e o que ainda se há-de ver, considero o emérito Marcelo o autêntico picareta falante e declaro que numas próximas eleições presidenciais votaria até no tele-evangelista para evitar transformar Belém num centro de intriga permanente, ainda mais nocivo do que nos tempos em que o seu ocupante foi Mário Soares.
ACTUALIZAÇÃO:
O que terá passado pela cabeça de quem produziu um vídeo, inspirado pelo professor Marcelo, para ser visto por uma dúzia de pessoas na Praça Sony em Berlim, que nesta altura do ano está com temperaturas negativas durante a noite? Ainda para mais um vídeo desajeitado e ridículo que coloca os portugueses numa posição de pobrezinhos a confrontar os ricos com as tristes vidinhas pelas quais só têm de se queixar de si próprios. Felizmente o bom senso alemão não autorizou a exposição das nossas misérias e livrou-nos de mais esta vergonha.
Não acreditando que o professor Marcelo, um homem inteligente e cosmopolita, não perceba o ridículo e a ineficácia de tudo isto, sou levado a concluir que o seu propósito é utilizar o expediente para mais uma das suas promoções pessoais.
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