Há duas semanas, a Economist fez uma síntese das razões porque o namoro Hollande-Merkel dificilmente acabará num casamento duradouro. Vale a pena revisitar essas razões.
Hollande defende a mutualização da dívida mas tem as maiores reservas às pré-condições de Merkel. Desde logo ao aprofundamento da união política porque a França, tradicionalmente com uma administração dirigista e muito centralizada, não está preparada para transferir mais soberania, dar mais poderes ao parlamento europeu e aceitar um superministério das finanças para controlar os orçamentos nacionais.
Se nas lengalengas discursivas, nos princípios abstractos e nos objectivos de longo prazo, quando todos os políticos que os enunciam já estarão reformados, ainda se podem encontrar algumas comunhões, quando se chega ao terreno prático das medidas a tomar as posições são irreconciliáveis. Merkel aceita a solidariedade (muito) depois da integração e Hollande quer a solidariedade já e depois logo se vê.
Se fosse só o anunciado insucesso deste casamento já não seria pouco, porque o eixo Paris-Berlim foi e será decisivo para a construção ou a desmantelamento da União Europeia. Mas não é só isso. São os requisitos institucionais, as negociações no Conselho Europeu, as aprovações pelos parlamentos e necessários arranjos partidários prévios, os pareceres dos tribunais constitucionais, as alterações dos tratados e em certos casos os referendos necessários, tudo isto numa altura em que os eleitorados não acreditam em «mais Europa». Salvo naturalmente os eleitorados do Sul que estão por tudo porque a falta de dinheiro não é boa conselheira.
Como disse o Cavaco Silva na única entrevista desde há muito, que me lembre, em que não entrou nos joguinhos de poder e para ficar bem na fotografia, a mutualização da dívida «é um problema a encarar daqui a uns dez anos». Por isso, as consequências deste casamento falhado e das famílias desavindas só podem ser mais do mesmo nos próximos meses e talvez anos, com as finanças públicas de toda a Europa latina a afundarem-se e a economia a degradar-se.
É o preço do voluntarismo da «construção europeia» que ludibriou a vontade dos povos e lhes impingiu uma moeda única sem consciência das consequências de o fazer sem as condições mínimas para a Zona Euro poder ser uma zona monetária óptima [ver aqui o que no (Im)pertinências se tem escrito sobre isso]. Ou, talvez pior, com a consciência que a Zona Euro para ser viabilizada exigiria uma união política pela porta do cavalo.
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