Grande parte da nossa elite sente um tolo prazer ao citar com frequência e aprovação a desprezível frase de Keynes: "a longo prazo estaremos todos mortos". Porém, quer do ponto de vista do diagnóstico, quer no âmbito da formulação de medidas de correcção eficazes, a perspectiva do longo prazo não pode deixar de prevalecer na abordagem da crise portuguesa.
As expectativas de longo prazo determinam agora as decisões nos mercados internacionais e explicam em grande parte as actuais dificuldades dos nossos poderes públicos em fazer baixar no mercado os juros de dívida soberana.
A actual crise veio realçar, com estrondo e sofrimento, a força de importantes mudanças na estrutura económica que reforçaram a influência do longo prazo nas decisões corrente de curto prazo: o aumento da esperança de vida, a redução do perímetro da família relevante, aumento do peso do Estado e do sistema público de protecção social, a crescente interligação entre a banca e os poderes públicos, o aumento do peso do sector financeiro no PIB e a importância dos movimentos internacionais de capitais.
As melhores projecções de longo prazo para a economia portuguesa são motivo de grande preocupação.
O elemento mais marcante das perspectivas económicas portuguesas de longo prazo é o decrescimento absoluto e relativo da população portuguesa. A fertilidade de 1,31 em 2010 descerá em 2015 para 1,30, ao contrário da Espanha que passará de 1,50 para 1,59 ou da Grécia de 1,54 para 1,61.
Entre 2010 e 2025 o PIB de Portugal crescerá a uma miserável taxa média de 1%, metade do que se verificará nos casos da Irlanda, Espanha ou mesmo da Grécia, repetindo-se a triste história dos últimos 15 anos. As projecções para 2050 não oferecem cenário diferente.
A população portuguesa entrou numa trajectória demográfica decadente que nos pode levar a ter no fim do século menos população do que a Irlanda, quando há 30 anos esta era 1/3 da nossa e hoje ainda é menos de metade.
Antes de tudo, o factor demográfico condiciona as perspectivas de crescimento e torna ilusórias a esperança de convergência económica com a Europa. A decadência demográfica não está desligada da ausência de dinamismo económico dos últimos 15 anos que levou a uma quebra da esperança das famílias e da natalidade.
Há uma hipótese que não pode deixar de ser colocada com enfâse. As opções de política social – nomeadamente o desprezo pelas medidas de protecção social visando directamente a família, a criança e a habitação – deverão ter contribuído fortemente para a retracção demográfica portuguesa. O sistema de protecção social português está orientado para o desincentivo à poupança e ao reforço dos laços sociais nas famílias. Na verdade, os montantes visando a protecção da família e da criança assumem montantes absolutos e relativos muito baixos, no caso da habitação um valor quase evanescente (0,003% do PIB).
A dependência cada vez mais forte ente o curto e o longo prazo é incontornável e os nossos credores sabem-no e olham cada vez mais para aí.
O longo prazo – contra o qual tantos se benzem - existe e condiciona o presente.
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«A vingança do longo prazo», Avelino de Jesus no Negócios Online
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