«Começou-se pelo imobiliário. Na última década e meia, Portugal vendeu terrenos do Alentejo a agricultores espanhóis, moradias no Algarve a turistas e reformados ingleses, prédios, avenidas novas e centros comerciais de Lisboa a fundos de "real estate" internacionais. Venderam-se também empresas, dispersando-as em Bolsa, mas mantendo o seu controlo em Portugal. Agora, acelerou-se a venda de posições estratégicas das grandes empresas. E mais virá com as privatizações, para as quais não há capacidade de aquisição pelos capitalistas portugueses.
O problema não é a entrega de empresas a controlo estrangeiro. Isso é até bom, na medida em que essas empresas se tornarem mais eficientes, oferecerem produtos e serviços melhores e mais baratos aos consumidores portugueses. O problema é que a entrada de capitais que essas vendas significam não se reproduz. Porque o capital não se fixa, entra por um ouvido e sai pelo outro. Os accionistas estão endividados, recebem o dinheiro e pagam ao banco português, que por sua vez está endividado, recebe o dinheiro e paga ao credor estrangeiro. Entra a 100 e sai a 200.
Veja-se o caso da PT. Imaginemos que a venda da Vivo se faz pelos 6,5 mil milhões de euros, um valor enorme que ultrapassa toda a receita orçamentada pelo Estado para o seu acelerado programa de privatizações. O que acontece ao dinheiro? Uma de duas coisas: ou é reinvestido, ou entregue aos accionistas como dividendo extraordinário. Provavelmente, as duas coisas acontecerão. O investimento será, supõe-se, no estrangeiro. E o dinheiro entregue aos accionistas, para onde vai? 70% vai para accionistas estrangeiros (que assim recebem o retorno do seu investimento); o resto é pago a pequenos investidores e ao chamado "núcleo duro" português, que está quase todo ele endividado junto de bancos estrangeiros ou junto de bancos portugueses… que estão endividados junto de bancos estrangeiros. No final, dos 6,5 mil milhões, pouco capital ficará em Portugal.»
[A grande execução, Pedro Santos Guerreiro no JdeN]
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