Não é a primeira vez que Pacheco Pereira se revela desconcortável com a vulgaridade dominante na Web, na blogosfera e em especial no centro geométrico das blogaridades que é a bloguilha. Desta vez é mais evidente do que o costume. Refiro-me ao post ESTA' A INTERNET A MATAR A NOSSA CULTURA? publicado no dia 12 - já com barbas pela bitola da blogosfera.
Nesse post JPP faz eco do livro de Andrew Keen «The cult of the amateur» que tem como subtítulo o título do seu post. Esclareço que não li o livro, nem prevejo que venha a lê-lo, a não ser que a prosa resista 10 anos. Adoptando (com reservas) algumas das angústias de Keen, JPP conclui preocupado não saber «até que ponto se encontrará um qualquer equilíbrio que trave o lixo demagógico que hoje enche tudo impante da sua nova voz tecnológica e salve a "nossa cultura", mas não posso, em nome dessa mesma "cultura", deixar de valorizar o acesso de milhões à porta de um mundo em que habita o "espírito", mesmo que assustado com tanta confusão.»
Não se vê motivo para tamanha preocupação. Pelo contrário, a pletora de amadores na Web, um fenómeno natural resultante da banalização da internet, constitui uma evolução desejável de vários pontos de vista e reflecte a extensão duma literacia que umas décadas atrás estava reservada a elites, frequentemente decadentes e quase sempre cooptando-se no interior das suas capelas bafientas. Essa literacia é visível até na bloguilha onde milhares de portugas discorrem num português escorreito (*) e, frequentemente, com pertinência (ocorre-me agora que este blogue se chama Impertinências) sobre os mais variados temas. Pode não ser uma academia, mas é um fórum bastante ventilado onde se confrontam ideias. É um mercado de ideias, onde da quantidade se pode depurar a qualidade, como em quase tudo.
Das centenas de milhar de miúdos e praticantes de todas as idades - amadores - que com mais ou menos jeito chutam bolas em becos e campos pelados, podem surgir Figos e Cristianos Ronaldos e, pasme-se, até Mourinhos. Dumas centenas de criaturas em inbreeding, que vivem num raio de 10 quilómetros com centro no Estoril, que frequentaram os mesmos colégios, que vão às mesmas missas, que treinam uns com os outros, podem surgir uns outros amadores, uns Sousas Uvas, que episodicamente fazem um brilharete no râguebi. Não mais do que isso.
Que a qualidade sobrevive sem dificuldade à quantidade poderia deduzir-se do facto do Abrupto (que certamente JPP considerará um paradigma dos blogues) resistir tão bem à concorrência que até está entre os mais visitados da bloguilha. Não fosse a concorrência tão numerosa e o Abrupto teria muito menos freguesia.
(*) Há excepções. Algumas nelas notáveis, como o maradona que escreve com imensos erros por diletantismo, presumo.
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