Numa entrevista a O Independente, na sequência da atribuição dum prémio pelo Clube de Jornalistas, o jornalista e escritor Armando Baptista-Bastos ilumina-nos com a sua visão do papel do jornalista, expressa em frases antológicas:
«O jornalismo tem que ser sobretudo o porta-voz daqueles que não têm voz.» «Não há factos. Os factos correspondem à visão do mediador, do repórter.» (Defendo um jornalismo de indignação e) «também um jornalismo de causas».
Preocupado (sem razão, parece-me) com as ameaças de conversão do jornalismo de causas em jornalismo «indolor e incolor», BB solta um aflito grito de alma - «o que querem é capar-nos», disse, talvez receando a continuidade geracional do «jornalismo de causas».
Um exemplo clássico do «jornalismo de causas» (já aqui referido pelo Abrupto) é o tratamento jornalístico da morte do cidadão brasileiro pela polícia anti-terrorista inglesa. Antes mesmo de se saber que a polícia tinha «de facto» divulgado «informação» errada, já o jornalismo de causas bramava, exigindo a condenação da política e o castigo da polícia.
A polícia lamentavelmente errou na aplicação duma política certa e acertou indesculpavelmente numa política errada de adulteração dos «factos». Mas, aos olhos do «jornalismo de causas», essa adulteração não deveria constitui um pecado grave para quem, afinal, «não há factos».
O doutor Daniel Oliveira, que tem a coluna de «opinião» «Choque e pavor» no Expresso, «informa-nos» esta semana que o brasileiro morto em Londres, na sequência dos atentados do mês passado, «foi executado pela polícia inglesa». Uma vez mais, «os factos correspondem à visão do mediador». Se o mediador entende que é «execução», passa a ser execução. Execução é diferente de «erro». «Erro», pelo menos desde que Lula foi eleito, é a execução regular com total impunidade pela polícia brasileira de facínoras, à mistura com inocentes.
É por isso é que um «jornalista» se «indigna» e se usar o seu jornal para promover maninfestações de protesto contra a «brutalidade» da polícia inglesa e a exiguidade da indemnização (8.000 salários mínimos brasileiros), isso não o obriga a «indignar-se» contra a regular brutalidade da polícia brasileira, nem a exigir um funeral para as vítimas dessa brutalidade. «Não há factos. Os factos correspondem à visão do mediador». Ponto final.
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