03/12/2004

O IMPERTINÊNCIAS FEITO PELOS SEUS DETRACTORES: Ainda a democracia das conveniências.

Do meu amigo AB e detractor do Impertinências, mais acidental que habitual:
«Li com atenção, apesar do pouco tempo que tenho nestes dias finais do ano, o seu texto sério sobre um assunto sério. Concordo com algumas coisas. Discordo de outras.

Sampaio, aceitou PSL para primeiro ministro há quatro meses. Apesar de considerar que iríamos entrar num período muito complicado devido principalmente à personalidade do novo primeiro ministro, considerei que o PR tomou a decisão correcta. Até aqui estamos ambos de acordo, parece-me.

Quatro meses depois, o PR dissolve a AR. E bem, segundo Je. Aqui discordamos.

Falar de «móbil» ou de «misterioso fundamento» enviesa a apresentação dos seus argumentos e por isso mesmo enfraquece-a. Haver interesses por detrás de qualquer decisão é inevitável em tudo na Vida. Na política ainda mais. Na baixa política muito, muito mais.

Parece-me evidente que os governos do PSL têm apresentado fissuras e atritos anormalmente altos. Remodelação após poucos meses, um ministro que se demite após uns dias em função, um mal-estar popular generalizado quanto ao Governo (fale com os taxistas, barómetro muito fiel da sociedade portuguesa, quer se fale de futebol quer se fale de política). Eu próprio, anti-socialista visceral, considero que a situação era ridícula e a curto prazo insustentável.

Se o PR não puniu Guterres, uma nódoa acabada, será isso motivo para não punir PSL? No máximo só provará a falta de consistência do PR. Mas quanto a isto, poucos tinham e têm dúvidas.

A política e mais particularmente a constituição não são obras cientificas. Em economia existe uma área, a dos contratos incompletos, na qual se prova que não é possível construir um contrato completo (no sentido de definir tudo sem deixar espaço para dúvidas). Se um contrato entre duas partes só pode ser incompleto, imagine-se quanto incompleta não poderá de ser uma constituição. E então a Constituição Portuguesa, fruto de calores revolucionários...

Os artigos que citou deixam uma ampla margem de manobra. É verdade: não há rebelião nem insurreição. Mas uma visão mais minimalista poderia considerar que um governo que não se aguenta 4 meses, um ministro que não se aguenta 4 dias, atritos evidentes entre os membros do Governo, a opinião generalizada que este não é um bom governo (e tudo isto sem uma oposição digna desse nome) é obra.

O governo não «funcionou regularmente»: não aguentou quatro meses, em maioria, sem crises de maior que pudessem de certo modo explicar a sua remodelação. Estamos todos de acordo que para gerir uma família, uma empresa, um país é preciso estabilidade. Conhece alguém mais desestabilizado do que o PSL? Quando há uns anos se criticava o modelo de gestão das empresas públicas com mudança de conselhos de administração de três em três anos, que dizer da governação de um país que não aguenta quatro meses e que honestamente surpreenderia se aguentasse os próximos quatro meses?

O professor Vital Moreira explica tudo isto muito melhor do que eu. Não sei se o faz do alto da sua autoridade mas em todo caso fá-lo e é reconhecido como sendo capaz de o fazer. Eventualmente poder-se-á não concordar com ele, mas deixe-o estar lá no alto da sua autoridade que apesar de tudo foi bem conquistada.

Os sound bites dos média certamente são um factor a considerar. Mas já encontrei o PSL duas vezes a entrar num restaurante (e eu não saio muito), com comitivas de cerca de duas dúzias de pessoas (das quais muitas mulheres, algumas jeitosas) quando eu estava a sair do restaurante. Não há nada que possa alterar o meu juízo: um primeiro ministro que sai para começar a jantar às 23h00 ou está vendido aos espanhóis e segue os horários e hábitos deles, incluindo a famosa siesta, ou então não pode governar a sério um país. Também pode não ser motivo formal para dissolver a assembleia, mas tem dúvidas que o pais está mal servido com PSL?

O PSD deu um tiro no pé ao eleger um palhaço. O PR teve a oportunidade de o tirar de lá. Se o fez no momento que mais lhe convém, que posso dizer? Foi esperto.

Em Espanha, o PP perdeu as eleições por causa de um erro. UM erro. UM só erro. Depois de tudo o que fez para desenvolver a Espanha. Será por isso menos democracia?

Ao retirar o tapete ao PSL, só vejo dois problemas: - se ele concorrer à eleições (poderá ele fazer outra coisa?) e ganhar estamos fritos; - se o PS ganhar estamos fritos.»

A resposta apressada do Impertinências (por email):
«Em muito do que diz, por de trás do óbvio bom senso, estão duas coisas: a falta de memória (com esses mesmos argumentos quase todos os governos anteriores deveriam ser demitidos - lembra-se da agitação social, das greves, das manifestações dia sim dia não?) e a ideia (perigosa) que os contratos sociais, isto é a constituição, se podem «ajeitar».

Os argumentos do bom senso resistem mal quando se considera o facto do PR pretender aprovar este orçamento para ser executado por um outro governo (ou o mesmo, mas nessa altura a dissolução terá sido inútil).

Não costumo entrar pelo caminho da análise conspiratória e também não vou fazê-lo desta vez. Alguém o fará por mim nos jornais.»

Mal escrevi esta última linha da mensagem fui expulso pela empregada que queria limpar o escritório e me obrigou a enviá-la assim mesmo, sofreando o o pesado fogo de artilharia que a mensagem do AB estava mesmo a pedir.

Quando a empregada finalmente me deixou regressar, já tinha perdido a virilina. Ainda mais porque ela partilhou comigo a sua análise da situação política:
ó sôtor o que é que me diz destes invejosos que estão a tramar o doutor Pedro? Têm mas é dor de cotovelo, porque ele gosta de mulheres e elas dele. Desses senhores nem as mulheres deles gostam, que são pagas para isso, quanto mais.
Vox popoli, vox Dei.

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