Our Self: Um blogue desalinhado, desconforme, herético e heterodoxo. Em suma, fora do baralho e (im)pertinente.
Lema: A verdade é como o azeite, precisa de um pouco de vinagre.
Pensamento em curso: «Em Portugal, a liberdade é muito difícil, sobretudo porque não temos liberais. Temos libertinos, demagogos ou ultramontanos de todas as cores, mas pessoas que compreendam a dimensão profunda da liberdade já reparei que há muito poucas.» (António Alçada Baptista, em carta a Marcelo Caetano)
The Second Coming: «The best lack all conviction, while the worst; Are full of passionate intensity» (W. B. Yeats)

16/06/2016

NÓS VISTOS POR ELES: O presidente-comentador visto por um sobrinho-neto de Kafka

«Nós vistos por eles» é onde se dá voz aos estrangeiros que falam de nós, em particular aos desgraçados que têm que nos aturar todos os dias. Hoje é a vez de Hemp Lastru que escreve no Económico e se auto-descreve assim «(n. 1954, em Praga) é sobrinho neto de Franz Kafka. Democrata convicto, activista e lutador político, é preso várias vezes pela polícia secreta checoslovaca, tendo sido sentenciado em 1985 ao corte de uma orelha sob a acusação de “escutar às portas”. Abandona a política em 1999, deixando Praga para residir em Espanha. Mudou-se para Portugal em 2005 porque “gostaria de viver num país onde os processos são como descrevia o meu tio-avô nos livros.”»

«O nosso Presidente excela nesta arte, é capaz de discutir todos os temas em todos os lugares e, o que é único, deixar uma impressão de grande conhecedor da matéria naqueles que nada percebem do assunto. Isto, porém, tem um custo. Como todos aqueles que finalmente encontram o seu desígnio, que atingem o nível de verdadeira excelência num domínio e que, por essa mesma razão, se libertam da lei da morte – para citar o poeta –, o nosso professor tem dificuldade, subconsciente ou inconscientemente, de sair fora da sua área de conforto, e comenta e comenta. Infelizmente, quando comenta não preside, tal como quando se preside não se comenta.

Porém, é algo imparável, mais forte que si, e que revela uma doença dos tempos modernos, consequência aguda da forte exposição mediática: a síndrome do pândita. Esta síndrome é identificável por quem dele padecer passar por quatro fases: na primeira fase, a fase ascendente, o pândita é convidado, fruto do seu reconhecimento como especialista, a pronunciar-se publicamente sobre acontecimentos e factos da sua área de especialidade, o que lhe dá consciência da sua singularidade e massaja o seu ego. Na segunda fase, dita da consolidação, alto da sua posição destacada no panorama da erudição nacional, o pândita começa a comentar tudo, e passa progressivamente dos factos às pessoas. Na terceira fase, a do isolamento, apenas a opinião dele existe, todos os outros estão errados, e passa até a ser ele próprio a estabelecer os factos que merecem ser comentados. Finalmente, vem a quarta – e última – fase, a do plano inclinado. Esta fase começa quando o nosso pândita se começar a comentar a si próprio; ainda não se sabe como acaba.=

Sem comentários: